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Bravo diz que pessoas estão cansadas de promessas e quer ser uma voz forte em Otava

Eleições Davenport

Bravo diz que pessoas estão cansadas-canada-mileniostadium
Vince Nigro entrevista Alejandra Bravo. Assista a entrevista por completo, nesta sexta-feira (17), às 19h30 na Camões TV. Créditos: Luciano Paparella Jr.

Davenport foi um bastião liberal durante 50 anos antes de uma vitória de Andrew Cash, do NDP, que ocupou o lugar entre 2011 e 2015. A nível provincial, o riding pertence ao NDP e é representado por Marit Stiles. Contudo, nas eleições de 2015, a ex-executiva da área financeira Julie Dzerowicz ganhou a volta para os Liberais por 1.441 votos (uma diferença de 1,9 por cento entre ela e Cash). Em 2019, a dupla voltou a concorrer e Dzerowicz ganhou por 1.439 votos (uma diferença de 2,7 por cento desta vez).

Em Davenport, que é composto principalmente por uma população ativa de classe média com uma grande comunidade portuguesa, a acessibilidade económica, a habitação, os transportes, o ambiente e as questões da terceira idade foram todas levantadas pelos residentes como preocupações.

Alejandra Bravo vive em Davenport desde 2000 e fala quatro línguas, incluindo o espanhol e o português. A candidata é diretora de liderança e formação no Broadbent Institute. A candidata a MP de Davenport pelo NDP tem trabalhado como organizadora comunitária e já se candidatou à Câmara Municipal de Toronto. A poucos dias das eleições a candidata natural do Chile esteve à conversa com Vince Nigro no programa “War Room” da Camões TV

Vince Nigro: O que o levou a envolver-se na política?

Alejandra Bravo: As minhas primeiras recordações são de tropas militares no Chile. Era uma criança pequena, tínhamos um governo democrático e a minha mãe e o meu pai despediram-se sem lágrimas porque ele ia defender o governo. A minha mãe ficou connosco. Vivíamos a poucos  quarteirões do palácio presidencial que foi bombardeado e lembro-me de eu e o meu irmão termos visto balas a entrar no nosso apartamento. Todos os anos na altura do Air Show tenho medo quando ouço o som dos aviões. Quando cheguei ao Canadá em 1974, depois de o meu pai ter sido preso, nessa altura não existiam muitos imigrantes da América Latina.  Lembro-me de acordar numa creche e de sentir alguém a retirar os meus brincos de ouro.  No Chile as pessoas usam brincos e eu tinha acabado de receber os meus no meu aniversário dois dias antes de deixar o país. Mas sabia o suficiente para perceber que naquele momento não me podia mexer e fiz de conta que estava a dormir. Mas porque é que este episódio é importante? Naquela noite fui para casa e contei aos meus pais e eles não fizeram nada porque sentiram que não tinham voz. Naquele momento decidi que ia passar a minha vida a certificar-me de que nunca ninguém sentiria o mesmo que eles.

VN: No fim de contas todos nós queremos as mesmas coisas – liberdade de expressão e oportunidades para que a nossa família consiga construir uma vida melhor. Então veio para o Canadá com a sua família e acabou por fixar-se na GTA?

AB: Os meus pais só tinham ouvido falar de Montreal e tinham esperança de um dia se mudarem para lá porque a minha mãe falava um bocadinho de francês. Mas eles disseram-nos para vir para Toronto e acabámos na área de Park Lawn em Etobicoke. Foi difícil porque na altura tínhamos a Western Guard que defendia a supremacia branca. Fomos atacados na rua, o meu pai e os seus amigos chegaram a ser espancados várias vezes. Todos estes episódios acabaram por me influenciar, mas por outro lado sempre sentimos muita solidariedade. Os meus pais eram socialistas e o NDP pressionou na altura o Governo de Pierre Trudeau para abrir as fronteiras. Eu cresci com pessoas que foram detidas, torturadas, que tiveram familiares que desapareceram, mas também cresci com pessoas muito solidárias. Havia pessoas vindas de Portugal, de uma ditadura, da Grécia, por isso, encontrámos aqui uma comunidade e reuníamo-nos. Lembro-me que quando a ditadura caiu em Portugal, a chamada Revolução dos Cravos, os meus pais abriram uma garrafa de vinho de Portugal e celebraram.

VC: Trudeau convocou eleições antecipadas. Acha que este é o momento certo para eleições?

AB: Não, de todo, porque o NDP estava a apoiar os Liberais. A promessa Liberal de cuidados infantis a $10 estava na plataforma do NDP e em maio disseram-nos que era irrealista. Ou temos de ir a eleições porque queremos dar aos trabalhadores federais 10 dias de doença pagos? Jagmeet Singh apelou a isso na Câmara dos Comuns em duas ocasiões antes de as eleições serem convocadas. Tivemos dois anos deste mandato e eu, na verdade, achava que iam esperar mais um pouco para que as crianças regressassem à escola. Não pensei que tivéssemos eleições antes de outubro por causa da nova variante delta. Mas Trudeau convocou as eleições e penso que não é apenas porque estão à procura de uma maioria, julgo que se cansaram de ser responsabilizados no parlamento. Na maior parte do mundo não existem governos super maioritários com qualquer tipo de controlo e equilíbrio. Neste governo, todas as decisões foram escrutinadas, o que é melhor para as pessoas. Penso que os Liberais vão pagar o preço porque agora é muito difícil de explicar porque estamos a gastar mais de $600 milhões numa eleição que ninguém queria. 

VN: O líder do NDP, Jagmeet Singh, é recordista nas redes sociais no TikTok. O que é que pensa sobre esta forma de fazer campanha? Para mim a promessa de planos de telemóveis mais baratos foi inteligente porque muitas pessoas se podem identificar com este problema. 

AB: O Jagmeet Singh é muito autêntico, a pessoa que veem na TV ou nas redes sociais é a mesma pessoa na vida real.  Eu pessoalmente julgo que já sou velha para TikTok, mas acho extraordinário que ele se consiga conectar com os mais jovens. Ele está a falar para uma geração que se preocupa com alterações climáticas, habitação a preços acessíveis, direitos indígenas. Eles são uma geração muito diferente porque cresceram com um mercado de trabalho e de imobiliário mau e sentem que o planeta não vai ser habitável daqui a alguns anos. Para além disso a pandemia tem tornado os contatos em pessoa difíceis. O trabalho de Singh é chegar a muitas pessoas para explicar o plano do NDP. Como candidatos o nosso trabalho é ter conversas com substância porta a porta e nesse aspeto posso dizer que a minha campanha é muito tradicional. Eu ligo-me às pessoas, encontramo-nos nas ruas e faço entrevistas como esta. Penso que uma campanha tradicional combinada com esta nova tecnologia é o caminho a seguir. Sobre os tarifários de telemóvel e o acesso à internet, pagamos as contas de telemóvel mais caras do mundo porque algumas empresas combinam os preços entre si. O NDP acredita que o acesso à internet é algo básico e que por isso deve estar ao alcance de todos. Em Ontário quando as escolas encerraram e os alunos ficaram a aprender a partir de casa tínhamos crianças sem acesso à internet. As pessoas com os rendimentos mais baixos são as que têm os tarifários mais caros. Já ouvi pessoas que deixaram a data ligada durante a noite por acidente e que depois receberam uma conta de $150. Quando Jagmeet fala do 1% contra os 99% são os bancos, as empresas de telecomunicações, as empresas petrolíferas…

VN: Mencionou que estava a fazer uma campanha tradicional porta a porta. Quando as pessoas abrem a porte quais são as suas preocupações?

AB: As pessoas falam sobretudo sobre desigualdades e clima, estão zangadas porque a Amazon não paga impostos federais. As pessoas estão preocupadas porque a desigualdade já aumentou demasiado. Durante a pandemia as empresas e as pessoas mais ricas acumularam recordes de milhares de milhões de lucro. As pessoas estão preocupadas com o que vai acontecer depois da COVID-19 e em como vamos reconstruir a economia. Achamos que esta é a altura de corrigir o desequilíbrio e de fazer com que os mais ricos contribuam um pouco mais para reconstruir a economia. Um estudo da Abacus revelou que cerca de 90% das pessoas defende que agora é tempo de aumentar os impostos para os ricos. A habitação é outra das preocupações das pessoas. Quem tem casa em Toronto acredita que os filhos não vão conseguir comprar casa própria cá. Sabemos que há lavagem de dinheiro, sabemos que grandes investidores de imobiliário compram casas em Toronto e 20% do mercado imobiliário está agora nas mãos destes investidores e não de famílias.

VN: A nível nacional a comparticipação de medicamentos e os cuidados dentários para todos são duas das grandes promessas de Jagmeet Singh. Mas a nível local, em Davenport, quais são as suas promessas?

AB: A questão da habitação é uma das mais importantes em Davenport porque temos pessoas a viverem em parques e muitas pessoas estão preocupadas com os sem abrigo. E porque a habitação é tão cara muitas pessoas estão a ser despejadas for “renoevicted”. A questão dos transportes também é muito importante. Surpreendo sempre as pessoas quando lhes digo que o autocarro da Dufferin é a rota de autocarros mais usada na América do Norte. Mas ao mesmo tempo Toronto é a única cidade na América do Norte que não recebe ajuda dos governos provinciais e federais para operar o seu sistema de transportes. Há a sensação de que estamos a ser negligenciados pelos MP’s Liberais da área de Toronto no Parlamento. E acho que isso está a fazer com que as pessoas considerem votar no NDP.

VN: Você está a concorrer contra Julie Dzerowicz, a MP Liberal que foi eleita pela primeira vez em 2015. Explique aos nossos leitores porque é que eles devem votar em si.

AB: Ao longo de 20 anos tenho trabalhado para esta comunidade. Lutei por melhorias nas escolas, nos transportes, tenho um historial de liderança e defendo que ter uma voz muito clara de Davenport em Otava é muito importante. As pessoas estão cansadas de promessas e não veem melhorias no seu dia a dia. A desigualdade está a crescer e as emissões de carbono estão a piorar.

Tradução: Joana Leal/MS

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