Aida Batista

De tradição a património imaterial

 

 

O caos tem um calendário rigoroso
e o nada, festas para guardar.
Juan Vicente Piqueras, in O Quarto Vazio

 

A última edição do Milénio dedicou várias páginas às celebrações da Páscoa, nas suas várias vertentes, desde as lendas às práticas religiosas e profanas que se realizam em várias localidades do nosso país. Muitos dos que vivem na nossa diáspora, é nesta época que decidem fazer uma visita curta aos seus lugares de origem para poderem reviver as memórias que dentro de si guardaram.

Entre as diferentes práticas, foram referidas algumas localidades onde as mesmas são de tal modo mobilizadoras, que atraem muitos visitantes. Nelas se incluem Óbidos, Castelo de Vide e Portalegre, S. Brás de Alportel, Braga, Porto, Amares, sem esquecer as ilhas – Açores e Madeira. Há outras iniciativas em que o religioso e o profano se confundem, como é o caso da Bênção dos Borregos, no Alentejo; o Enterro do Bacalhau, nas Beiras; a Queima de Judas, em Trás-os-Montes, ou a Bênção dos Alimentos, em várias regiões de Portugal. Claro que há muitas mais, mas o jornal não poderia referir todas.

Como vivo, habitualmente, na Vila do Sardoal (distrito de Santarém), gostaria de vos contar que as tradições pascais desta vila são de tal maneira importantes que a Direção Geral do Património Cultural classificou a Semana Santa e a Festa do Espírito Santo como Património Cultural Imaterial (publicado em DR de 28 de dezembro de 2023), o que encheu de orgulho a população da Vila, conforme declarações à Lusa de Miguel Borges, Presidente da Câmara:

“É um reconhecimento completamente justo porque a população tem sabido manter a tradição durante séculos, tem sabido transmiti-la de geração em geração e é uma alegria e um orgulho muito grande para todos nós”.
De entre as tradições da Semana Santa, destaco a decoração das capelas com tapetes de flores e a Procissão dos Fogaréus, que decorrem na Quinta-feira Santa: a inauguração oficial das capelas, à tarde, ficando expostas até ao domingo de Páscoa, e, à noite, a procissão.

Quem assistiu às Jornadas Mundiais da Juventude, teve oportunidade de apreciar o tapete de flores, organizado por uma equipa de sardoalenses, no Parque Eduardo VII.

Na Semana Santa, esses tapetes baseiam-se em motivos religiosos dedicados à Paixão de Cristo e são feitos apenas de elementos naturais: pétalas de flores de várias tonalidades, verduras, cascas de árvores, que exalam um perfume a natureza, consoante os elementos que preenchem os vários desenhos traçados no chão. Além das capelas da Vila, que são várias, aderem também a esta iniciativa todas as aldeias do Concelho, num total de 19 igrejas e capelas.

Apesar de esta tradição se repetir, anos a fio, a verdade é que os motivos nunca se repetem, devido à imaginação e criatividade dos responsáveis por cada capela, o que faz com que a Vila seja um polo de atração de visitantes das redondezas, bem como imensos turistas que, propositadamente, aqui se deslocam. Será caso para utilizar de empréstimo uma conhecida expressão: “Na Semana Santa, todos os caminhos vão dar ao Sardoal”.

A procissão dos fogaréus, considerado também o ponto alto as celebrações, ganha uma mística especial de religiosidade pelo ambiente criado à hora do evento. A Vila fica às escuras (é também desligada a iluminação pública) e, da Igreja da Misericórdia, saem os Irmãos, de opa vermelha e archote na mão, transportando outros os estandartes com réplicas do séc. XVIII dos painéis alusivos a vários momentos da Via-Sacra. A Filarmónica, interpretando música fúnebre, vai à frente da procissão marcando o compasso até à colina, onde se situa a Igreja do Convento Franciscano seiscentista de Sta Maria da Caridade.

Considerando que a Páscoa é uma festa móvel, esteja atento e marque já no seu calendário uma visita ao Sardoal, no próximo ano.

Aida Batista/MS

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