Luís Barreira

A minha aventura como emigrante (2)!

imigrante - milenio stadium

 

Antes de o visitar e quando pensei pela primeira vez no Luxemburgo, tinha apenas umas antigas ligeiras noções liceais deste pequeno país, com um aspeto escurecido, cinzento e negro do carvão e das minas de ferro, frio e chuvoso. Após a minha primeira visita ao país, num dia solarengo, fiquei deveras surpreendido com um país verde, bonito, arrumado, limpo e organizado.

Neste quadro cénico, algo diferente do meu país de origem, interroguei-me sobre que fatores contribuíram para que esta pequena parcela do território europeu se apresentasse de forma tão graciosa.

No texto da minha crónica anterior tive ocasião de me referir a alguns aspetos históricos, económicos e políticos que poderão, de alguma forma, ter influenciado a evolução deste país. No entanto, o que foi dito, não explica tudo sobre a atitude política nacional no desenvolvimento do Luxemburgo. Há que considerar outros fatores que influenciam a mentalidade política decisória dos seus dirigentes e do seu povo em geral, donde destaco: o Luxemburgo é um pequeno país “encravado” entre as aspirações (e invejas…) dos países limítrofes (França, Bélgica e Alemanha), face à situação económica privilegiada que detém, obrigando as suas comunidades dirigentes a um esforço permanente de negociações e procura de novas soluções que equilibrem e/ou desenvolvam a sua própria situação económica; no Luxemburgo existe um forte sentimento de preservação de uma identidade cultural em permanente configuração, face a uma história plena de ocupações estrangeiras, uma conjuntura europeia que o obriga ao cumprimento de algumas determinações, nem sempre aceitáveis pelos setores mais nacionalistas e a uma realidade social quotidiana que faz com que a população luxemburguesa seja minoritária no seu próprio país, face ao contingente de estrangeiros que nela residem e os belgas, franceses e alemães que atravessam as suas fronteiras para lá trabalhar diariamente.

Na minha opinião, estes fatores pesam no subconsciente e de forma horizontal em todas as camadas da população luxemburguesa, originando-lhes uma permanente defesa contra o seu eventual desmembramento enquanto nação, face à “intromissão estrangeira” nas suas decisões nacionais e provoca problemas de sociabilidade com os estrangeiros residentes e trabalhadores no país, apenas refreados pela sua grande necessidade de mão de obra, pela manutenção da riqueza de que dispõem e pelas suas obrigações europeias e internacionais.

Também o fator linguístico luxemburguês intercede naquilo que acabei de expor, razões que me levaram a envolver-me em discussões públicas sobre o assunto. O multilinguismo da sua população e o seu estatuto de Grão-Ducado fazem do Luxemburgo um país especial, onde coexistem três línguas oficiais: o luxemburguês, o alemão e o francês.

Cedo compreendi que a utilização de três línguas oficiais, mais do que um simples meio de comunicação, encerra fatores de exclusão social, diminuindo ou aumentando os fatores de progressão social e profissional ou o simples relacionamento social com a população luxemburguesa residente.

Habituados em Portugal, por humildade, reconhecimento ou simpatia, a tentarmos ou mesmo a exprimirmo-nos na língua dos nossos visitantes estrangeiros, para nos fazermos compreender de forma amistosa, no Luxemburgo a utilização de cada uma das três línguas revela objetivos bem diferenciados. A comunicação numa das línguas oficiais, para obter uma resposta adequada, tem muito a ver com o perfil linguístico de base do interlocutor.
Falando luxemburguês, uma língua com origens imprecisas, vocábulos “multiusos”, uma gramática incipiente e uma fonética difícil (para um latino acabado de chegar…), um estrangeiro consegue mais facilmente socializar-se com a população luxemburguesa, criar empatias e um razoável relacionamento de vizinhança e trabalho.

A língua francesa é a mais utilizada nas relações do trabalho indiferenciado e no comércio em geral. Língua que constitui, de forma geral, o único meio de comunicação entre as empresas e o maior contingente de trabalhadores estrangeiros no Luxemburgo, os portugueses (cerca de 100 mil e 31,5% entre os estrangeiros).
A língua alemã é aquela que dá acesso a postos de trabalho superiores, serve de fator distintivo na comunicação e é utilizada na informação veiculada pelos jornais tradicionais luxemburgueses, publicados em língua alemã, embora com o decorrer dos tempos tenham vindo a surgir jornais em francês. No entanto, com a evolução financeira do Luxemburgo, a língua inglesa tem assumido um papel profissional de destaque.

Considerando as dificuldades de socialização provocadas por este multilinguismo, o caso da numerosa comunidade portuguesa, cuja imensa maioria não dispõe de muitos conhecimentos linguísticos e culturais e com os filhos em idade escolar, o problema é ainda maior. As crianças têm de falar português com os seus progenitores, francês com os seus colegas e amigos e luxemburguês e alemão na escola o que, na pior das hipóteses, leva a que acabem por não falar bem qualquer destas línguas! Não podendo ser ajudadas pelos pais, acabam por ter grandes dificuldades na aprendizagem, tendo de frequentar o futuro ensino em francês, destinado a reproduzir os tipos de profissão dos seus progenitores.

Considerei, ao longo da minha estadia no Grão-Ducado do Luxemburgo, que esta atitude de forçar o uso do multilinguismo, na formação escolar das nossas crianças e jovens, tinha origem num problema luxemburguês na área da sua identidade, ou seja, o receio de que estas permanentes “invasões” de trabalhadores estrangeiros diluíssem a sua identidade nacional, o seu patriotismo, o seu país, ou talvez ainda o receio da perda dos seus empregos “privilegiados”. Em vários fóruns em que participei, com a presença de responsáveis luxemburgueses e portugueses pela educação, tive ocasião de afirmar que a língua é, essencialmente, um veículo de comunicação e não pode ser um fator de exclusão social (os americanos não são menos americanos por falarem inglês…) e a reprodução dessa exclusão com as crianças, através do sistema de ensino existente no Luxemburgo, empurra os jovens para a escala inferior do mundo do trabalho, impedindo a sua ascensão social.

“Mas o que é que isso interessa, quando o salário mínimo no Luxemburgo é 2.257,00 euros por mês?”, perguntarão alguns!..

Sobre isso e outras coisas falaremos nas próximas crónicas.

Luis Barreira/MS

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