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A América e o futuro da democracia

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O mundo está, de facto, enfraquecido porque Trump o enfraqueceu com a sua aversão ao multilateralismo, com o seu nacionalismo narcisista e o seu comportamento autoritário. Porque só olhou para os seus interesses e ignorou a necessidade de manter os equilíbrios do mundo e uma moral mínima que impeça que ele se transforme numa selva.

Os avisos chegam de todos os lados. Se Donald Trump ganhar as eleições nos Estados Unidos, as democracias estarão em perigo, tanto na América como no resto do mundo. Ao longo do seu mandato tornou-se óbvia a sua vontade de querer controlar tudo e todos, de pressionar países sem qualquer respeito pela sua soberania, sem esconder a sua admiração pelos líderes autoritários e sem nenhum problema em deixar pairar a ideia de que não aceitará os resultados se perder. No que está transformada a América…

As eleições nos Estados Unidos despertam sempre uma enorme expetativa a nível mundial. Compreende-se, por se tratar de uma potência global em termos económicos, militares, científicos, tecnológicos e culturais, e ainda por ser considerada a maior democracia no mundo, apesar das suas imperfeições e disfuncionalidades, que também existem. A América, apesar dos seus desvios e interferências abusivas na vida de outros países, como na América Latina, sempre foi a pátria das liberdades, da democracia e dos direitos cívicos.

Mas aquilo que agora se vê da parte de Trump é uma total indiferença perante estes valores. Hostilizou a União Europeia ao ponto de a considerar inimiga porque, comercialmente, é um concorrente de peso a nível global. E apoiou sem vergonha o Brexit, que é uma forma de atingir o projeto europeu. A Europa e a América sempre constituíram uma importante aliança de democracias, capazes de ter influência positiva no Estado de direito noutras partes do mundo, que agora está também posta em causa. “A União Europeia é tão nefasta como a China”, chegou a dizer numa entrevista à Fox News.

Em contrapartida, flertou com Putin, numa relação que, de resto, já vem de longe com a Rússia, claro, pela via dos negócios – a Rússia, que também está apostada no enfraquecimento da Europa, porque esta se opõe muito particularmente ao seu apetite expansionista e insiste na defesa dos direitos humanos e das liberdades. Flertou com Kim Jong-un, com Duterte, com Erdogan…. Mas hostilizou a chanceler Merkel e o Presidente Macron.

A verdade é que, durante os quatro anos da governação Trump, foram os líderes de extrema-direita, o populismo e os autoritarismos que se sentiram legitimados e apoiados para dar livre curso às suas provocações aos princípios democráticos e aos seus propósitos reacionários, racistas e xenófobos. Foi este o período em que as questões raciais chegaram ao rubro e em que as sociedades viveram momentos de maior tensão. O mundo ficou mais perigoso, imprevisível e dividido.

Nos Estados Unidos, Trump lançou-se contra a imprensa e as redes sociais, sem esconder o desejo de as condicionar e calar. Também tentou, com sucesso, controlar os tribunais federais e o Supremo Tribunal, colocando juízes conservadores, que garantem por muitos anos o seu legado favorável em relação a questões como a utilização de armas e muitas outras caras aos evangélicos, como em relação ao aborto e outros valores que fazem parte do seu credo.

No plano internacional, rasgou todos os acordos que podia, bilaterais e multilaterais e, acima de tudo, bombardeou as Nações Unidas e as suas agências, como antes nunca tinha acontecido. E quanto ao Médio Oriente não apenas afrontou as Nações Unidas com a provocadora mudança da embaixada americana para Jerusalém como tem feito tudo para torpedear a possibilidade de um entendimento justo para a Palestina, com a criação de um Estado ao lado de Israel a viver em paz e em segurança. Mais: tem estado muito ativo a tentar convencer outros países a mudarem também as suas embaixadas para Jerusalém, criando assim um problema ainda maior a nível geopolítico.

O mundo está, de facto, enfraquecido porque Trump o enfraqueceu com a sua aversão ao multilateralismo, com o seu nacionalismo narcisista e o seu comportamento autoritário. Porque só olhou para os seus interesses e ignorou a necessidade de manter os equilíbrios do mundo e uma moral mínima que impeça que ele se transforme numa selva.

É por estas e por muitas outras razões que uma nova vitória de Trump seria uma tragédia para o mundo. Esperemos que Joe Biden ganhe expressivamente e que Trump não enverede pelo caminho das querelas judiciais sem fim. Pior: que, com essa atitude de obsessiva manutenção no poder, não sejam os seus Proud Boys e outras milícias armadas até aos dentes a querer transformar uma derrota em vitória. Paradoxalmente e com estupefação, são estes os tempos que hoje vivemos.

 

Paulo Pisco / Deputado do PS pelo círculo da Europa

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