Aida Batista

Que se calem para sempre

 

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Quando eu mais precisei, seguraste a minha mão.

Augusto Branco, poeta brasileiro.

 

Não tenho por hábito escrever sobre política. Contudo, não deixo de ter as minhas convicções partidárias, nem nunca me senti impedida de exprimir a minha opinião. Tratou-se simplesmente de uma opção. Considerando que a vida à minha volta me dá matéria-prima suficiente para escrever, deixo a política para os que a ela se dedicam.
Felizmente, e desde que iniciei a minha colaboração neste jornal, sempre me foi dada liberdade total para escolher os temas sobre os quais me debruço, sem nunca me ter sido recusada a publicação de qualquer texto.
Desta vez, também não vou quebrar a regra, mas, de forma enviesada, talvez assim possa ser interpretada. Portugal está a viver uma profunda crise política, todos o sabemos. Temos um primeiro-ministro demissionário (mas ainda não exonerado), e eleições antecipadas já marcadas para dar voz ao povo, que é “quem mais ordena”. Entretanto, no passado sábado (11), foi amplamente divulgado pela comunicação social que António Costa faria uma comunicação ao país às 20 h.

Como é hábito, nestas situações, fica-se suspenso do que irá ser dito. Seguem-se horas e horas de comentários feitos por “achólogos” e “tudólogos” (como por cá dizemos), que tentam vaticinar o conteúdo do discurso, havendo opiniões para todos os gostos, neste jogo de adivinhação com que os espetadores são entretidos. Ficámos também a saber que, após a comunicação, os jornalistas teriam direito a colocar questões.

Não vou referir nenhuma das que versaram assuntos de caráter económico, político, ético ou moral, mas apenas aquela que achei absolutamente inusitada, e se prendia com o porquê de, naquela noite, o primeiro-ministro ter levado a sua mulher. (Registe-se que segui tudo em direto na SIC Notícias). Quando António Costa se dirigiu à tribuna para falar, entrou por uma porta sozinho e com as folhas de papel na mão. Em momento algum, enquanto António Costa discursou e respondeu às questões postas pelos jornalistas, foi captada qualquer imagem da sua mulher. Soube-se, posteriormente, que Fernanda Tadeu já se encontrava sentada na carpete que cobria o chão da sala.

O Palácio de S. Bento é a residência oficial do primeiro-ministro de Portugal, assim como o Palácio de Belém é a residência oficial do Presidente da República, a menos que estes decidam prescindir de o fazer, mantendo-se a viver nas suas próprias casas. Cavaco Silva, por exemplo, ao longo de quase 10 anos, viveu em S. Bento; Santana Lopes também o fez, tendo mais tarde declarado não ter sido uma boa decisão, pelo desconforto de não ter a família por perto e, principalmente, pela falta de uma mulher que o apoiasse. Não tem sido a prática de António Costa (e de outros que o antecederam) que, como sabemos, vive na sua própria casa em Benfica.

Aonde quero chegar é que, sendo o Palácio de S. Bento residência oficial do primeiro-ministro, e salvaguardados os casos em que o protocolo não permite, por que razão não poderia António Costa ter levado consigo a sua mulher? Independentemente dos juízos de valor que dele se possam fazer como governante, Fernanda Tadeu, mais não fez do que cumprir o juramento prestado a seu marido: “estar ao seu lado na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias da vida que partilhariam juntos” e que já são muitos. António Costa, que não gosta de expressar publicamente as suas emoções, limitou-se a responder: “Há gestos de carinho que não carecem de explicação, só de gratidão.”

De tudo o que foi dito naquela noite, foi esta declaração humana de gratidão que retive, tendo-me lembrado de uma outra célebre frase da liturgia do casamento, que aqui reduzo a “Fale agora ou cale-se para sempre”.
Em situações graves, como a que presentemente vivemos, quem tão a despropósito faz perguntas deste tipo deveria estar calado. Para sempre!

Aida Batista/MS

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