Mundo

Cidade vinícola italiana torna-se um exemplo para a recuperação rural na UE

Cidade vinícola italiana -mundo-milenio

Créditos: Claudio Giovanni ColomboAsti mostra como as regiões rurais da Europa podem reverter o despovoamento através da agricultura e do património local.

Perto da cidade de Asti, no noroeste de Itália, conhecida pelas suas vinhas e pelo seu vinho branco espumante, Alberto Mossino ajudou a cultivar uma cultura diferente: o milho.

Numa quinta rodeada por uma villa do século XIX, revitalizou a produção de milho Ottofile, utilizado para fazer polenta. Ottofile, um tipo de grão vermelho alaranjado e com um sabor cremoso, típico da região, está em risco de extinção desde a Segunda Guerra Mundial como resultado da competição com outras variedades.

Mudança positiva

Mossino é o diretor da PIAM, uma organização não governamental que ajuda a integrar refugiados na sociedade italiana. A organização fazia parte de um projeto que recebeu financiamento da UE para revitalizar áreas rurais através do património local.

“Foi uma grande oportunidade para a região e para os refugiados”, afirma Mossino. “Mudou a mentalidade da população local em relação aos imigrantes de forma positiva.” Quase um terço da população da UE vive em áreas rurais, onde os benefícios incluem mais tranquilidade e uma maior proximidade com a natureza do que as cidades podem oferecer.

No entanto, as regiões rurais enfrentam desafios assustadores, incluindo o despovoamento, especialmente devido ao facto de os jovens se deslocarem para outros locais em busca de melhores perspetivas de emprego. As áreas rurais da Europa têm visto as suas populações diminuir ao longo de décadas e prevê-se que percam mais 8 milhões de pessoas até 2050.

Em resultado, estas áreas são frequentemente caracterizadas pelo envelhecimento dos residentes e pela ausência de instituições básicas e serviços públicos. “Temos uma população muito envelhecida e os jovens partem porque nem temos uma universidade”, afirma Mossino, nascido e criado em Asti e oriundo de uma família de agricultores.

Perspetivas mais positivas

As iniciativas europeias de investigação têm vindo a explorar a agricultura e o património cultural para inverter a tendência geral e apontar o caminho rumo a uma perspetiva económica e social mais promissora para as regiões rurais.

Na frente agrícola, os esforços estenderam-se para ajudar os jovens a iniciarem-se na atividade, nomeadamente colocando-os em contacto com agricultores mais experientes.

No que diz respeito ao património cultural, a tónica tem sido colocada no aproveitamento das oportunidades locais em áreas como a arte, os festivais, a gastronomia, os marcos históricos e as peregrinações, onde a rica história e a diversidade da Europa estão patentes.

Também a migração desempenhou o seu papel, conforme mostrado pelo projeto UE no qual Mossino estava envolvido. Denominada RURITAGE, a iniciativa decorreu durante quatro anos até agosto de 2022.Cidade vinícola italiana -mundo-milenio

Mossino e os seus colegas formaram cerca de 50 refugiados de África para ajudarem a renovar a abandonada Villa Quaglina, um antigo seminário de uma ordem católica denominada Oblatos de São José. Transformaram a estrutura em quartos de hóspedes e espaços para eventos.

Em seguida, a equipa trabalhou a área circundante da quinta, que se tornou desde então a maior produtora de milho Ottofile da região. Este tipo de milho tem grãos com uma camada exterior dura e deve o seu nome às oito filas – “otto” em italiano – de cada espiga.

Segundo Mossino, o trabalho local intrigou os locais, que quiseram saber mais sobre o projeto e os seus resultados.

Quanto aos refugiados, ao estarem envolvidos no património local, tiveram a possibilidade de se integrar melhor na comunidade e de permanecer na região de Asti. A presença dos recém-chegados levou à reabertura de uma escola e de outros serviços públicos.

Modelos rurais

O trabalho de Mossino e da PIAM no RURITAGE é um modelo, representando zonas rurais que utilizaram o seu património cultural para prosperar de uma forma que pode ser reproduzida por outras regiões em muitos países.

No total, estiveram envolvidas no projeto 19 regiões modelo, desde Coimbra, em Portugal, a Ørland, na Noruega. Partilharam a sua experiência e conhecimentos com 24 outras comunidades rurais em toda a Europa – desde a Galiza, em Espanha, até Polevaya, na Ucrânia – para as ajudar a desenvolver estratégias de recuperação.

“O património pode funcionar como um poderoso motor para regenerar as zonas rurais de forma sustentável”, afirmou Hanna Elisabet Åberg, investigadora da Universidade de Bolonha, em Itália.

Åberg coliderou o projeto RURITAGE, cujos resultados incluem uma ferramenta em linha com a qual as regiões podem analisar os seus territórios e encontrar inspiração para iniciativas de recuperação.

“Concentrámo-nos nas zonas urbanas durante demasiado tempo”, afirmou. “Em muitos aspetos, as zonas rurais são, de facto, o futuro.”

Aspirações dos jovens

Outra equipa de investigadores, que também recebeu financiamento da UE, concentrou-se em atrair os jovens para as regiões rurais da Europa para viver e trabalhar. O projeto de quatro anos, denominado RURALIZATION, terminou em abril de 2023.

“É a falta de oportunidades que faz com que as zonas rurais entrem em declínio”, afirma Willem Korthals Altes. “Os jovens gostam de viver aqui, mas não conseguem encontrar formas de ganhar a vida.” Korthals Altes foi o coordenador do projeto e é professor de ordenamento do território na Universidade de Tecnologia de Delft, nos Países Baixos.

Ao promover oportunidades económicas e sociais para a nova geração, acredita que a atual espiral negativa de declínio populacional nas zonas rurais pode ser invertida. Korthals Altes e os seus colegas questionaram os jovens quanto às suas ambições rurais e procuraram ajudar a tornar esses objetivos realizáveis.

“São mais os jovens que sonham em ir para as zonas rurais do que para as zonas urbanas”, declarou. No total, 23 organizações parceiras de 12 países uniram forças para criar estratégias para estimular esta renovação geracional e dar uma nova vida às zonas rurais. Os parceiros vão desde a agência de investigação agrícola irlandesa Teagasc e a Universidade de Turku, na Finlândia, até ao Centro Nacional de Investigação Científica francês e à cooperativa agrícola Kulturland, na Alemanha.

Futuros agricultores

Por exemplo, o RURALIZATION identificou várias práticas para ajudar as pessoas que querem iniciar uma carreira na agricultura.

Mais de metade dos agricultores da UE têm mais de 55 anos e estão perto da reforma, destacando a necessidade de atrair pessoas mais jovens. Embora a Política agrícola comum, pedra angular da UE, apoie os jovens agricultores de várias formas, incluindo financeiramente, os projetos de investigação oferecem perspetivas complementares.

Imre Kovách, professor de sociologia na Universidade de Debrecen, na Hungria, liderou uma equipa no âmbito do projeto que entrevistou jovens agricultores em 10 países europeus para compreender melhor as suas motivações e dificuldades.

O maior obstáculo acabou por ser o acesso à terra.”Na maioria dos países europeus, não existe terra disponível para cultivo e os preços são elevados”, referiu Kovách.

Em resposta, várias associações envolvidas no RURALIZATION ajudaram jovens aspirantes a agricultores a encontrar terras, colocando-os em contacto com agricultores mais velhos que pretendem deixar as suas atividades agrícolas.

O projeto também publicou um manual de políticas que mostra às autoridades locais como podem ajudar nesta frente com exemplos práticos, ferramentas e ideias.

Geração verde

O RURALIZATION concluiu que os jovens agricultores europeus estão mais preocupados com a proteção ambiental e mais abertos à utilização de tecnologias avançadas, como os satélites, do que os seus colegas mais velhos.

“A geração mais jovem não quer apenas lucrar com a agricultura, mas também tem em mente novos desafios, como a sustentabilidade e alimentos de melhor qualidade”, afirmou Kovách.

Por conseguinte, afirmou que os decisores políticos devem ir além da prestação de apoio financeiro aos jovens agricultores, ajudando-os também a desenvolver uma atividade sustentável.

Os participantes no RURITAGE, incluindo Mossino, em Asti, fizeram ecoar a noção de que o apoio às zonas rurais deve ir para além do financiamento.

“Os decisores políticos têm de compreender que não precisamos apenas de dinheiro, mas também de uma perspetiva a longo prazo e de tempo”, declarou.

Para Simona Tondelli, coordenadora principal do RURITAGE e professora de engenharia ambiental na Universidade de Bolonha, a chave é envolver as próprias comunidades na regeneração rural.

“É importante não impor apenas estratégias ou soluções a níveis mais elevados, mas partir dos desafios e oportunidades locais para encontrar um caminho para o desenvolvimento sustentável”, referiu.

Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.

Redes Sociais - Comentários

Artigos relacionados

Back to top button

 

O Facebook/Instagram bloqueou os orgão de comunicação social no Canadá.

Quer receber a edição semanal e as newsletters editoriais no seu e-mail?

 

Mais próximo. Mais dinâmico. Mais atual.
www.mileniostadium.com
O mesmo de sempre, mas melhor!

 

SUBSCREVER