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Pare, escute e olhe

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A situação social tem vindo a revelar-se particularmente difícil. O dinheiro que não chega para sustentar a família, a saúde mental que vai de mal a pior, a falta de suporte familiar… tudo isto e mais algumas coisas como, por exemplo, casos de violência doméstica, apagam do horizonte qualquer esboço de projeto de vida e o desespero instala-se. Tudo isto acontece mesmo aqui, ao nosso lado. Por vezes, as necessidades são ocultadas, disfarçadas por vergonha.

É difícil estender a mão para pedir, é muito mais fácil estender a mão para ajudar. Precisamos de estar atentos ao que nos rodeia, aos pequenos sinais de que algo não está bem. É preciso parar, escutar e olhar com olhos de ver. Sentir a dor que vai na alma de quem está próximo, mas tão distante ao mesmo tempo.
Neste Natal quisemos parar para refletir um pouco sobre a importância da partilha, escutámos quem conhece a realidade – o Abrigo Centre e o First Portuguese. Pedimos a indicação de famílias (4) necessitadas e rapidamente foram identificadas. Curiosamente as duas instituições trouxeram-nos realidades semelhantes – duas mães com filhos e duas pessoas idosas, que vivem sozinhas. Arregaçámos as mangas e começámos a trabalhar para concretizar a ideia que surgiu numa conversa de colegas.

Reunimos as nossas vontades de fazer algo para proporcionarmos um Natal um pouco mais feliz a quem realmente precisa e juntámos parceiros importantes neste abraço coletivo. Esta ação só foi possível graças à extrema generosidade de: Paulo Távora, do Távora Foods de Mississauga, que nos encheu os cabazes com amor, em forma de produtos alimentares; a mão amiga e doce da D. Dina, da Doce Minho Pastry & Bakery, que não deixou que faltasse Bolo-Rei na mesa de Natal destas famílias e ainda ao supermercado Duarte de Hamilton que também fez questão de participar nesta ação solidária.

Pelo meio, temos ainda que realçar o gesto tão bonito das duas funcionárias da peixaria do Távora Foods, Luísa Fernandes e Raquel Rosmaninho, que ajudaram com dinheiro que saiu dos seus bolsos e dos seus corações tão especiais.

No final, quem ficou com o coração quentinho fomos nós – saber que cada cabaz proporcionou sorrisos, um esgar de felicidade e que o Natal de cada família vai ser um pouco melhor, é a melhor prenda que recebemos este ano. E se lhe contamos tudo isto é apenas para lhe dizer que vai sempre a tempo de ajudar também. Afinal, como dizia a canção – “o Natal é quando um Homem quiser”. É só preciso que pare, escute e olhe com o coração.

Nestas pequenas entrevistas, Cidália Pereira do Abrigo Centre e Carina Paradela do First Portuguese explicam melhor o trabalho que cada instituição faz no terreno e dão dicas para quem quiser ajudar quem precisa.

Madalena Balça/MS

 

 

Carina Paradela – First Portuguese Canadian Cultural Centre

Milénio Stadium: O First Portuguese tem desenvolvido um trabalho social importante de apoio à comunidade portuguesa. Pode especificar as valências que têm e que tipo de apoio dão aos vossos utentes?
Carina Paradela: Em termos de trabalho social o nosso foco é o centro de dia para idosos. Estamos abertos de segunda a sexta-feira das 9am às 15h e servimos pequeno-almoço e almoço. Temos várias atividades e o objetivo maior é combater a solidão que existe na sociedade, principalmente entre os mais idosos.

MS: Como suportam financeiramente o vosso trabalho?
CP: Para além de alguns serviços pagos, com doações, alguns apoios governamentais e principalmente com o apoio do OLG Charitable Gaming, um programa em que participamos com trabalho voluntário e recebemos parte dos lucros de uma casa OLG em Scarborough. É um programa fantástico para o qual estamos sempre a procura de voluntários.

MS: Com o contacto próximo que têm da realidade, que tipo de necessidades e problemas afetam a comunidade portuguesa residente em Toronto?
CP: Neste momento, penso que todos os mesmos problemas que afetam as outras comunidades. Com o custo de vida tão alto, as necessidades básicas de vida estão a tornar-se cada vez mais insustentáveis. Da nossa parte, tentamos sempre que os nossos idosos tenham um sítio onde passar o dia e pelo menos duas refeições equilibradas. Também recebemos alimentos e apoiamos famílias carenciadas com alimentos todas as semanas.

MS: De que maneira pode a comunidade ajudar os que realmente precisam de ajuda?
CP: Voluntariando o seu tempo nas instituições que prestam ajudas necessárias neste momento. E claro que com doações se o conseguirem. Também é muito importante haver amor pelo próximo e compreensão. Cada vez mais há uma necessidade extrema de amor pelos outros.

MS: Que mensagem quer deixar para a comunidade, nesta altura festiva do Natal?
CP: Que este Natal vos traga paz, alegria e amor. E que o próximo ano seja repleto de saúde e momentos maravilhosos passados em comunidade. De todos nós no First Portuguese, um desejo de um Feliz Natal e Próspero Ano Novo para toda a comunidade!

 

Cidalia Pereira – Abrigo Centre

Milénio Stadium: O Abrigo Centre tem desenvolvido um trabalho social importante de apoio à comunidade. Pode especificar as valências que têm e que tipo de apoio dão a quem vos procura?
Cidália Pereira: O Abrigo Centre está aberto a todos. Começando com a parte prática, estamos abertos de segunda a sexta-feira, das nove ao meio-dia, e da uma às cinco da tarde. Quanto ao nosso público-alvo, temos aqui muita gente com vários tipos de necessidades, mulheres que passaram por situações de abuso e que procuram acima de tudo: apoio, informação, encaminhamentos, aconselhamento, etc. Temos também recém-chegados ao Canadá que procuram saber os seus direitos e nós somos o elo de ligação entre eles e o governo, dando-lhes toda a informação de que necessitam. Temos também pessoas de idade avançada que querem saber informações sobre o processo da reforma. Então, aí também prestamos informação, ajuda e apoio para “navegar” os sistemas das pensões das reformas aqui no Canadá.
E atendemos outras pessoas falantes de língua portuguesa, que residem neste país, como também de língua inglesa ou outras raças que nos veem no internet e vêm procurar ter uma informação, um encaminhamento, uma referência. E temos a nossa equipa de triagem que vai avaliando a necessidade de cada um e tenta ver se é algo que vai encaminhar internamente ou externamente. Por exemplo se é um caso para um serviço do nosso Programa de Apoio à Mulher Vítima de Violência Doméstica, se é uma pessoa que deve ser encaminhada para um centro para tratar de questões ligadas à reforma ou se é um recém-chegado que precisa de determinado tipo de apoio ou se se trata de um pai ou mãe, procurando um programa de apoio para mães ou para apoio para pais.

MS: E para além desse apoio, de aconselhamento, de orientação, têm também a preocupação com pessoas que estão com necessidade de outro tipo de apoio, nomeadamente de roupa e comida? Também tentam resolver essas situações ou, pelo menos, fazer face a algumas delas?
CP: Sim, com a COVID e mesmo depois a grande preocupação foi dar apoio a quem procurava ajuda financeira, através dos programas que existiam nessa altura. Agora alguns voltaram a trabalhar, mas outros precisaram de procurar trabalho. Depois surgiu também esta questão do aumento nos alugueres, aumento na comida etc… e agora mesmo os que estão a trabalhar não estão a conseguir suportar a despesa. O dinheiro não rende o que rendia, então a maior parte das chamadas que recebemos trazem problemas como: conflitos em casa; procura de apoio financeiro e pedidos de comida. Devido ao número de chamadas que estamos a receber, com pedidos para estas questões financeiras, estamos a fazer muito encaminhamento para o Food Bank. Mas entendemos que a pessoa que vai lá só pode ir uma vez por mês ou duas vezes por mês e a comida que dão só dá para três ou quatro dias e depois o dinheiro que eles têm não dá para comprar mais coisas que precisam. Temos casos de pessoas que não têm dinheiro para comprar comprimidos para as dores porque usaram o dinheiro para pagar o aluguer, pagar o telefone e já não há mais para nada.

MS: Com o contacto próximo que tem da realidade, porque estão muito no terreno, digamos assim, próximo das pessoas. Que tipo de necessidades e problemas estão a afetar a comunidade portuguesa?
CP: As nossas estatísticas que saíram no relatório anual, feitas com os dados fornecidos pelo nosso grupo de triagem, dizem-nos que no ano fiscal que mediou entre abril de 2022 e 31 de março 2023, recebemos 6345 pessoas. Dessas, 502 eram mulheres abusadas. E durante este ano fiscal tivemos um aumento de 25% em chamadas, pedindo informação e ajudas de qualquer tipo. E o grupo de triagem acha que este ano os pedidos de comida, de uma casa (para mudar de casa devido ao aumento do aluguer) têm aumentado 200%.
Antigamente era mais “perdi o meu trabalho. Quero aplicar para o Employment Insurance. Quero saber como é que funciona a reforma aqui, de que documentos preciso?”, hoje é verdade que também continuamos a ter este tipo de pedidos, mas o grande número das chamadas é focado no problema de falta de dinheiro para pagar a renda da casa e para comer. Entre as pessoas que nos contactaram, 80% são diretamente de origem portuguesa.

MS: De que maneira é que a comunidade pode ajudar os que realmente precisam de ajuda? O que é que sugeria como técnica, como pessoa que conhece o que está a passar? O que é que sugere às pessoas que estão a ler o jornal e que até podem ficar com vontade de dar uma ajuda?
CP: Pode ajudar diretamente com o seu tempo e dar uma doação para os bancos da alimentação. Ser mais proativo a trabalhar com a Câmara em algum programa de apoio aos indivíduos mais vulneráveis. Se sabe de uma mulher que está a precisar de ajuda, interesse-se e pergunte como é que pode ajudar, leve-a para um sítio onde ela pode ser ouvida e ajudada. Isto é muito importante porque sabemos que, a cada dois dias uma mulher está a ser assassinada no Canadá.

MS: Que mensagem é que a Cidália gostaria de deixar para a comunidade portuguesa nesta altura festiva do Natal?
CP: Para todos desejo umas boas festas. Desejo que tenham algo para pôr na mesa, para partilhar com a família e pessoas queridas. Que trabalhem a questão da compaixão pelo outro e pratiquem a gratidão. Todo mundo está muito stressado, muito ansioso com tudo, há muita crise à flor da pele. Desejo paz e harmonia para todos.

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