Carta aberta ao povo brasileiro
Desde que eu cheguei ao Canadá, é comum ouvir de algumas pessoas: “Não se preocupe tanto com os problemas do Brasil, agora você está aí, no primeiro mundo”. Mas sugerir isso para mim é o mesmo que me pedir para não me importar com os problemas da minha mãe.
Essa pátria me pariu, essa é a realidade! Me diz como renegar a minha miscigenação de povos – afinal, o Brasil é essa mistura rica de etnias, culturas e histórias – como renegar minha terra; terra essa em que se plantando, tudo dá? Como ignorar os meus irmãos e irmãs? Existe uma fórmula que gere ruptura e frieza suficientes para cortar o cordão umbilical com meu país? Se houver, tira essa tesoura pra lá, porque eu não quero! Pretendo deixar meu cordão intacto até o final da minha vida. Sou brasileira e isso nunca vai mudar!
Dito isso, vejo de longe (mas sentimentalmente perto) meu povo dividido, com medo, confuso, assim como uma parcela da população à beira de um surto coletivo quando acreditam que a Terra é plana ou que o coronavírus é uma farsa.
Vejo pessoas tentando fazer a sua parte, vejo profissionais da saúde clamando “pelo amor de Deus” para as pessoas ficarem em casa, que ajudem nesse processo de achatamento da curva de contágio; também vejo muitas pessoas pedindo socorro pois estão desempregadas e não tem dinheiro para comprar alimentos para os filhos; e tem pessoas se engajando em recolher contribuições para o próximo. É uma mistura de forças, algo bem característico do Brasil.
Essa mistura, na qual o povo brasileiro foi forjado, carece de valorização e reconhecimento pelos próprios brasileiros, o que seria uma forma de aumentarmos nossa autoestima e um meio de nos unir num mesmo ideal.
Nesse momento histórico que estamos vivendo em nível global, é hora de pararmos de digladiar por políticos, por mitos, heróis e salvadores da pátria. A verdadeira força está em cada um de nós, quando exercemos o nosso poder enquanto cidadãos. Somente através da união dessas forças, atingiremos o objetivo comum e urgente hoje: sobreviver com dignidade.
Enquanto houver esse clima de batalha por todos os lados, essa polaridade insana, estaremos fadados ao atraso como nação. Eu não peço a você, que está lendo essas palavras, que simplesmente as acate como verdade; apenas estou pedindo para refletir sobre essa ideia. A ideia de deixarmos os políticos de lado e exigirmos o que nos é de direito: vida, liberdade, igualdade e segurança.
Só deixaremos de ser “colônia” o dia que entendermos, primeiramente, o quanto nosso país é rico, diverso, gigante, independente, e com potencial inimaginável. Que somos um povo criativo e batalhador.
Essa ânsia paternalista que o povo brasileiro tem e projeta num salvador da pátria que vá resolver todos os problemas do país como num passe de mágica é, definitivamente, o atraso do Brasil. Precisamos incorporar a ideia de que a mudança começa em cada um de nós e que a honestidade que tanto queremos dos nosso governantes é reflexo das pequenas atitudes que temos no nosso dia-a-dia. Tenho a sensação de que a maturidade de um povo consiste em perceber a relação existente entre a gestão de um governo e o nosso próprio comportamento, o nosso próprio caráter. Quando entendermos isso, será o “click” que nos mudará como povo e, com certeza, saberemos utilizar melhor o nosso voto, rumo a um país menos desigual e em paz. E eu sei que isso é o que todos almejamos independentemente das nossas preferências ideológicas.
Adriana Marques/MS
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