Temas de Capa

Por obra e graça do “Espírito Santo de Orelha”

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Como é que os promotores imobiliários influenciaram o Governo de Ford a abrir os seus terrenos do Greenbelt para habitação?

Muito já veio à tona da água desde que foi tornado público o extenso e pormenorizado relatório da Auditora-Geral, Bonnie Lysyk., embora se pense que muito mais há-de vir a ser descoberto, à medida que se escavem os terrenos pantanosos de todo o processo de desanexação de terrenos da zona protegida, com vista à construção de habitação.

O clima de suspeição de favorecimento e ações não condizentes com a lei já vem de trás, daí que os três líderes da oposição ao Governo de Doug Ford tivessem solicitado formalmente a auditoria. Apesar disso, Ford manteve-se implacável e determinado, e mesmo após conhecer o relatório, veio a público dizer que aceita 14 das 15 recomendações da Auditora-Geral. Só que a recomendação não acolhida, acaba por derrubar todos os que pensavam que este relatório poderia fazer retroceder o Premier de Ontário – Ford afirma que não aceita parar o processo, porque é preciso construir 50 000 habitações.

Sendo absolutamente verdade que o Ontário, ou melhor dizendo a GTHA precisa urgentemente de construir casas para que seja possível dar resposta às necessidades de hoje e do futuro, sendo até compreensível que se argumente que não se pode travar o desenvolvimento, sendo desejável que esse desenvolvimento assente num modelo canadiano de cidades, que se compõem essencialmente por casas unifamiliares e não se transformem em réplicas de cidades como Nova Iorque, onde se cresce essencialmente para cima… Sendo tudo isto verdade, o que está aqui em causa é o intenso odor a favorecimento, a uns quantos “developers”, que são já donos de grande parte dos terrenos, agora já livres dos condicionalismos que o Greenbelt impunha. Das duas uma: ou são visionários que conseguiram adivinhar o que iria acontecer e compraram os terrenos (alguns, um, dois meses antes de tudo avançar…), ou tiveram a sorte de ter um santo protetor – o chamado “espírito santo de orelha”.
Uma das revelações mais impactantes do relatório explosivo da Auditora-Geral, Bonnie Lysyk, sobre a controversa troca de terrenos do Greenbelt foi precisamente a forma como um pequeno número de promotores imobiliários conseguiu utilizar o seu acesso a um alto funcionário do governo para conseguir que determinados terrenos fossem libertados para construção de habitações.

Através de encontros num evento do setor e de mensagens de correio eletrónico enviadas pelos seus advogados, os promotores imobiliários conseguiram fazer pressão para que fossem retiradas as proteções ambientais dos terrenos de que são proprietários no Greenbelt.

O relatório de Lysyk revelou que as decisões sobre os locais a eliminar foram tomadas durante um período de três semanas, em outubro, pelo agora ex-chefe de gabinete do ministro da Habitação Steve Clark, Ryan Amato (resignou ao cargo na passada terça-feira, dia 22), e por um pequeno número de burocratas por ele dirigidos na chamada Equipa do Projeto Greenbelt. Quando alguns dos locais selecionados não cumpriam “determinados critérios”, não eram tidos em conta. Aliás, o relatório revela que 21 dos 22 locais que foram considerados no processo de avaliação sobre que terrenos deveriam ser removidos do Greenbelt, foram “trazidos para a mesa” por Amato. Desses 22 locais, 15 foram selecionados e sabe-se agora que desses, 12 foram escolhidos por indicação específica dos promotores imobiliários ou dos seus representantes.

Como tudo terá acontecido?

Pacotes num jantar do setor

Amato e o vice-chefe de gabinete de Clark participaram num jantar promovido pela BILD (Associação da Indústria da Construção e do Desenvolvimento de Terrenos) e ficaram sentados na mesma mesa que vários promotores imobiliários e um lobista registado, de acordo com o relatório. Na primeira semana de outubro, Ryan Amato apresentou à equipa do projeto “informações em papel de pacotes que recebeu” de promotores imobiliários sobre oito locais a considerar para remoção do Greenbelt.

Mais tarde nesse mês, forneceu à equipa cinco pen USB contendo informações adicionais sobre os locais propostos para remoção.

Os advogados enviaram e-mails ao chefe de gabinete

Um escritório de advogados, que representa três promotores imobiliários, não mencionados no relatório, entre 27 e 29 de setembro de 2022, pediu a Ryan Amato através de e-mails, que retirasse da proteção do Greenbelt os terrenos de que os seus clientes eram proprietários.
A troca de e-mails prosseguiu até ao início de outubro de 2022.

Qual o papel do Premier e do ministro da Habitação neste processo?

Ford e Clark disseram a Lysyk que não tinham conhecimento de que o terreno escolhido para remoção estava a ser apresentado por Amato através dos promotores. Ford disse que só foi informado sobre os terrenos no dia anterior à aprovação das alterações pelo Conselho de Ministros, a 2 de novembro, enquanto Clark disse que teve conhecimento do plano na semana anterior.

E agora?

Um dia depois de Lysyk ter divulgado o seu relatório, o Governo de Ford pediu ao Comissário para a Integridade do Ontário que investigasse se Ryan Amato tinha violado alguma regra de ética ou de conflito de interesses.
Essa foi, aliás, uma das já referidas 15 recomendações de Lysyk – 14 das quais foram aceites pelo governo.
Na passada quarta-feira (23), a Real Polícia Montada do Canadá anunciou que está a investigar a forma como o Governo Ford tratou o Greenbelt, depois de a polícia provincial lhe ter remetido o processo.

Madalena Balça/MS

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