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Trump mentiu e Biden tremeu: o debate-espetáculo que deixou os democratas de mãos na cabeça

O debate colocou frente-a-frente Biden e Trump pela primeira vez em quatro anos. Foto: Mario Tama/Getty Images/AFP

Dois homens brancos na casa dos 80 anos debateram o futuro do Estados Unidos durante mais de hora e meia, com os olhos postos no passado e com ataques pessoais à mistura. Entre economia, aborto e imigração, debateu-se também o peso de Trump e a idade de Biden, cujos lapsos verbais intensificaram os temores democratas.

Um homem contido e imperturbável a mentir compulsivamente e outro a deixar o partido assustado de tanto que tremelicou. Assim se resume, em duas ideias, o primeiro debate presidencial entre o republicano Donald Trump, de 78 anos, e o democrata Joe Biden, de 81, que voltaram a lembrar ao mundo o espetáculo circense que é a vida política do país mais poderoso do mundo. Trump e Biden debateram economia, política fiscal, política externa, imigração e o aborto que nunca poderiam fazer, num confronto em que o chefe de Estado, engripado, apresentou uma postura vacilante, com voz rouca e respostas que lhe custavam a sair, e em que o ex-presidente, mais confiante, rebateu as críticas do opositor com um chorrilho de falsidades. O debate evidenciou as visões diferentes sobre praticamente todas as questões fraturantes do país e uma profunda hostilidade entre os candidatos.

O desempenho frágil de Biden, na forma trémula e no conteúdo incoerente, especialmente no início do confronto, inflamou as preocupações de muitos eleitores que temem um futuro incerto com a sua reeleição, gerando uma nova onda de apelos no seio dos democratas para que o candidato se afaste do cargo e dê o lugar a alguém mais capaz de enfrentar Trump nas urnas. Apesar de ter jogado ao ataque nas intervenções, o atual presidente mostrou-se confuso e perdeu várias vezes a linha de pensamento, misturando temas diferentes na mesma resposta e paralisando durante alguns segundos à procura da palavra certa.

Começou o debate a tentar defender os resultados económicos da sua governação, justificando-se com os danos da pandemia e apontando o dedo à herança trumpista, que deixou a economia num “caos” que teve de ser revertido. Atrapalhou-se com o direito ao aborto, um dos temas mais importantes para os democratas nas eleições deste ano, não tendo sido capaz de se opor de forma clara a quaisquer restrições nem de explicar o caso Roe v. Wade, a decisão histórica do Supremo Tribunal que legalizou o aborto em todo o país, em 1973, e que foi derrubada há dois anos por um Supremo conservador com três juízes nomeados por Trump.

Mentiras sobre imigrantes para captar eleitorado

Quatro anos depois de ter promovido teorias da conspiração sobre a derrota republicana nas últimas presidenciais, que culminaram na insurreição de 6 de janeiro, Trump voltou a repetir as alegações de fraude em 2020 e escusou-se a garantir se aceitaria os resultados das eleições de novembro, dizendo que os aceitaria caso a votação seja “justa” e “legal”.

Perante as afirmações de Biden, distorceu repetidamente os resultados do seu período no cargo e vários factos acerca de economia, pandemia e imigração – de acordo com a CNN, Trump fez cerca de 30 falsas afirmações, contra nove de Biden. Exemplos: sugeriu falsamente que Biden estava a enfraquecer o programa de assistência social por causa da entrada ilegal de imigrantes, “a morar em hotéis luxuosos na cidade de Nova Iorque”; acusou Biden de ter “encorajado” a Rússia a invadir a Ucrânia; e disse que o seu mandato teve “os melhores números ambientais de todos os tempos” e “a melhor economia da história” – tudo desmentido de seguida pelos principais jornais norte-americanos. “Nunca ouvi tanta asneira em toda a minha vida”, retorquiu Biden.

Sobre o direito ao aborto – que se tornou uma vulnerabilidade para os republicanos -, Trump não conseguiu descolar-se do retrocesso legal, defendendo apenas exceções para “violação, incesto e risco para a vida da mãe”. Tentou, no entanto, assumir uma postura mais cautelosa, reiterando ter devolvido a questão aos estados após a anulação do caso Roe v. Wade, que outrora concedia o direito federal.

Peso e idade como “argumentos”

Num aparente esforço de provocação, o atual presidente dirigiu vários ataques ao antecessor, metendo a carne toda no assador, desde a recente condenação criminal ao suposto insulto aos veteranos da Primeira Guerra Mundial, passando pelo peso do republicano. Num dos momentos mais tensos da noite, entrou numa vertente mais pessoal ao evocar o filho, Beau, que serviu no Iraque antes de morrer de cancro no cérebro e criticou Trump por ter, alegadamente, chamado de “parvos e perdedores” aos norte-americanos que morreram em batalha. “O meu filho não era um perdedor, não era um parvo. Você é o parvo. Você é o perdedor”, atirou. Por seu turno, Trump fez troça da idade de Biden, que acusou de ser um fraco “palestiniano”, usando o termo como uma espécie de insulto contra o democrata.

Democratas tremem e admitem discussão sobre continuidade

Biden precisava de ter mostrado pujança para vencer Trump e levar a cabo os próximos quatro anos, mas a imagem que deixou foi de declínio. Os aliados do republicanos declararam imediatamente vitória, enquanto democratas proeminentes questionaram publicamente se Biden estaria em condições para avançar. “Acho que o pânico se instalou”, disse David Axelrod, conselheiro de longa data do ex-presidente Barack Obama, sobre o desempenho de Biden, imediatamente após o debate.

“Não sei se vão levar a alguma coisa, mas vai haver discussões sobre se deve continuar. Não se saiu nada bem”, disse Van Jones, outro estratega democrata. Falando na CNN, a vice-presidente do Partido Democrata, Kamala Harris, tentou defender o presidente, ao mesmo tempo que reconheceu as críticas. “Houve um início lento, mas um final forte”, considerou. Questionado, mais tarde, sobre a sua prestação, Biden disse aos jornalistas que achava ter-se saído “bem”, admitindo estar com “dor de garganta”. Pressionado sobre as preocupações dos democratas Biden negou afastar-se da candidatura e argumentou que “é difícil debater com um mentiroso”.

Pormenores

Regras
Para evitar a repetição de cenas caóticas registadas em debates anteriores, foram ditadas regras incomuns: debate sem público; silenciamento dos microfones quando o candidato rival estiver a falar; e proibição de os candidatos levarem notas escritas ou trocarem ideias com as suas equipas de campanha durante os intervalos.

Próximo debate
Biden e Trump deverão voltar a enfrentar-se no dia 10 de setembro, num segundo debate organizado pela rede ABC News.

JN/MS

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