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Mundo sem fronteiras

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Ano novo, vida velha… ou pelo menos repetida. Ora vejamos: segundo dados da Organização das Nações Unidas, mais de 820 milhões de pessoas (mais de 10% da população mundial) passam fome quotidianamente. E muitas (demasiadas, claro está) são crianças. Nem preciso de vos lembrar que este problema é causado por uma série de fatores. Não há, de facto, uma causa única. Podemos aqui lembrar, por exemplo, os conflitos regionais (por exemplo, o caso do Iémen), e, principalmente, a pandemia e a suas consequências e ainda tudo o que adveio da guerra entre Rússia e Ucrânia. Na realidade, como resposta por exemplo ao corte de exportação dos cereais provenientes da Ucrânia e da Rússia que alimentavam tantos, os países rapidamente aumentaram as restrições à exportação de alimentos e fertilizantes, deixando diversos povos em situação de insegurança alimentar.

Para além deste fator gerador de profunda instabilidade social, a guerra e a pandemia causaram uma crise financeira que está a atingir a escala global e a instalar na sociedade o medo pelo que há-de vir. A recessão é cada vez mais uma ameaça real e vai atingir mesmo os países mais estruturados economicamente.

É importante também não esquecer a crise energética e migratória que a guerra está a provocar que associadas às mudanças climáticas, à revolta pelos direitos das mulheres no Irão, e à tensão permanente nas relações da China com o mundo ocidental, formam aquilo a que muitos chamam a “tempestade perfeita”, que trará muita dor e sofrimento já neste ano de 2023, que agora iniciamos. Muitos de nós já sentem na pele e no bolso as suas consequências, mas o que interessará perceber é o que tudo isto poderá provocar na sociedade global. Para isso conversámos com Merle A. Jacobs, Ph.D. e professora associada do Departament of Equity Studies, da Universidade de York, que entre outras coisas sublinha o que parece ser uma evidência, mas que importa sempre destacar – nestas histórias relacionadas com questões económicas o mundo não tem fronteiras e são os trabalhadores e os mais pobres quem mais sofre. Sempre.

Milénio Stadium: Vivemos num mundo onde a palavra imprevisibilidade parece dominar cada vez mais os nossos dias. Que impacto este facto tem na sociedade?
Merle A. Jacobs: A sociedade não é um grupo uniforme e aqueles que são ricos e os que estão no poder podem superar a maioria das situações. São os trabalhadores, nomeadamente, os mais pobres que sofrem o impacto mais difícil. A classe média fica stressada quando existem circunstâncias imprevisíveis, uma vez que muitos não têm a capacidade de combater as reviravoltas da vida.

MS: A situação socioeconómica, mesmo nos países mais estáveis em termos políticos e económicos, tende a agravar-se, perante uma esperada recessão à escala global. Como sociólogo quais são as consequências que mais teme da previsível acentuada perda de poder de compra, instabilidade no emprego…, em consequência da recessão?
MAJ: Vejo o mundo como algo sem fronteiras quando se trata de questões económicas. Vimo-lo com a situação causada pela pandemia de Covid e agora com a guerra na Ucrânia. Estes acontecimentos afetaram o mundo inteiro. Durante estes tempos, muitos tiraram partido e aumentaram os preços, o que se tornou um problema, produzindo uma perda de poder de compra. No Canadá, as notícias atuais dos meios de comunicação social apontam para o grupo Loblaw como tendo ganho 3 mil milhões, enquanto as pessoas estão a enfrentar os seus preços com cada vez mais aumentos.

MS: Sabemos que um quadro de instabilidade social e económica é (ou pode ser) gerador de movimentos políticos ou sociais radicais (extrema-direita ou extrema-esquerda) que assentam o seu discurso no populismo (dizer o que as pessoas querem ouvir). O que é que, na sua opinião, pode e deve ser feito para evitar esta situação?
MAJ: Isto tem vindo a acontecer há séculos, mas agora com as redes sociais está a tornar-se muito mais perigoso a nível global. Baseia-se geralmente em teorias ideológicas.
Existem movimentos sociais positivos e eu não chamaria os extremos como movimentos sociais. Muitos são perigosos, como vimos nos EUA em 6 de janeiro com a extrema-direita.
Os elementos radicais estão a utilizar as redes sociais para aumentar o seu número e também para promover a violência. É necessário que haja regras para aqueles que possuem estas plataformas.

MS: A guerra na Ucrânia e as consequências que tem provocado – aumento exponencial de preços; migração forçada de milhões de pessoas; receio do desencadear de uma guerra nuclear… – a pandemia e o medo que ainda gera… transformaram as pessoas que éramos. Acentuou-se a solidariedade ou pelo contrário, o foco está cada vez mais no individuo? Quase num espírito de “salve-se quem puder?”
MAJ: Isto deve ser designado como um genocídio pelo Presidente russo contra a Ucrânia. Esta ameaça de armas nucleares tem países do G7 que apenas enviam armas defensivas e é um problema complexo para as pessoas que leem sobre a guerra, o que as fará temer as ameaças da Rússia.
Não é cada país por si, uma vez que o mundo livre se uniu para se defender apoiando a Ucrânia. Contudo, isto tem desestabilizado a alimentação de muitos países que compravam produtos da Ucrânia.
A maioria das pessoas tem uma falta de conhecimento, pois nunca querem ver as notícias, e muitas não votam no Canadá. Para ter solidariedade é necessário ter defensores fortes que forneçam uma mensagem clara sobre as questões do dia que estão a afetar a sociedade.
A sociedade é constituída por muitos grupos diferentes que precisam de ouvir a mensagem de uma forma que possam compreender e juntar-se para o bem de todos. Haverá sempre alguns que ignorarão e tentarão perturbar a sociedade.
A sociedade está menos empenhada após o confinamento durante a pandemia, pois quanto menos socializamos, mais fazemos as coisas por nossa conta.

Madalena Balça/MS

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