![\"filhos](\"https:\/\/mileniostadium.com\/wp-content\/uploads\/2023\/01\/gabby-orcutt-7E29j_4GBNI-unsplash.jpg\")
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Ser m\u00e3e \u00e9 ser tudo o que nunca se tinha sido e n\u00e3o ser nada do que se era antes. Ser m\u00e3e \u00e9 ter uma miss\u00e3o, mas sentir-se perdida no caminho. \u00c9 muita entrega, sacrif\u00edcio, muitos dias sem dormir e preocupa\u00e7\u00f5es que n\u00e3o acabam. \u00c9 ser sentido de responsabilidade movido por amor que n\u00e3o se explica. Ser uma m\u00e3e emigrante, \u00e9 ser-se m\u00e3e sem a rede de apoio que toda a gente diz ser essencial, mas da qual poucos querem participar. Ser m\u00e3e \u00e9 ouvir muitas cr\u00edticas, principalmente de pessoas que n\u00e3o fizeram nem fariam melhor.<\/strong><\/p>\n A nossa sociedade evoluiu, as mulheres passaram a ser protagonistas da pr\u00f3pria vida. Sa\u00edram de casa \u00e0 procura de liberdade financeira \u2013 algo essencial para quem quer ser dono de si pr\u00f3prio. Cada vez mais a mulher ganha destaque em todos os setores da economia. O papel da mulher na sociedade mudou, mas n\u00e3o mudaram as expectativas. Espera-se tanto de uma m\u00e3e e t\u00e3o pouco de um pai. Quando a m\u00e3e acorda, prepara a crian\u00e7a para a escola, vai trabalhar, vai buscar a crian\u00e7a, faz o jantar, brinca, arruma, adormece a crian\u00e7a \u2013 essa m\u00e3e \u00e9 s\u00f3 uma m\u00e3e. Quando um pai o faz, esse pai \u00e9 um \u00f3timo pai porque ajuda.<\/p>\n S\u00e3o estes estere\u00f3tipos antiquados que alimentam as culpas de uma m\u00e3e, e esse talvez seja o maior desafio da maternidade \u2013 o nunca se sentir que se faz o suficiente. Uma m\u00e3e continua a ser uma mulher mesmo depois que a crian\u00e7a nasce, com objetivos que podem incluir a fam\u00edlia, mas que tamb\u00e9m v\u00e3o al\u00e9m dela. Uma m\u00e3e que escolhe n\u00e3o abdicar de uma carreira, \u00e9 ego\u00edsta e n\u00e3o devia ter sido m\u00e3e. Uma m\u00e3e que escolhe ficar em casa \u00e9 pregui\u00e7osa e sem expectativas de vida. H\u00e1 quem diga que n\u00e3o se pode ter tudo, ou ser\u00e1 que n\u00e3o se pode ter tudo porque realmente uma pessoa sobrecarregada n\u00e3o consegue agradar a todos?<\/p>\n Al\u00e9m da carga emocional e do desgaste f\u00edsico que vem acompanhado das horas mal dormidas, segue-se uma quest\u00e3o essencial \u2013 o lado financeiro. N\u00e3o basta haver boa vontade, \u00e9 realmente necess\u00e1rio que a carteira d\u00ea conta dos gastos. Viver no Canad\u00e1 e ter filhos torna-se cada vez mais desafiante para qualquer fam\u00edlia. N\u00e3o basta ser classe m\u00e9dia para n\u00e3o considerar o lado financeiro de se ter filhos. O aumento do custo de vida, faz com que fam\u00edlias numerosas vivam em cub\u00edculos, com que a alimenta\u00e7\u00e3o n\u00e3o seja a melhor e com que o bem-estar das crian\u00e7as possa ser posto em causa. Apesar do per\u00edodo de licen\u00e7a de maternidade ser bastante generoso no Canad\u00e1, apercebi-me depois que isso talvez seja devido \u00e0 falta de lugares dispon\u00edveis em infant\u00e1rios. De qualquer forma, d\u00e1-nos a oportunidade de acompanhar a crian\u00e7a durante um ano a um ano e meio, mesmo que o retorno financeiro seja pouco durante esses meses. O pior vem depois, quando n\u00e3o se encontra uma vaga num infant\u00e1rio para se voltar ao trabalho. Ou talvez o pior seja mesmo voltar ao trabalho e aperceber-se do que sobra do ordenado depois de se pagar o valor astron\u00f3mico dos infant\u00e1rios. Antes, estranhava tantas m\u00e3es em casa a tempo inteiro. Ser m\u00e3e \u00e9 o melhor papel que alguma vez vou desempenhar na vida, mas tinha receio de abdicar do resto daquilo que eu sou e quero ser, do exemplo que quero tentar construir para a minha filha. Hoje percebo que os julgamentos que acabava por fazer na altura, afinal podem apenas ser a (\u00fanica) escolha financeira de outra pessoa \u2013 l\u00e1 est\u00e1 o julgamento que n\u00e3o gosto e que sem me aperceber tamb\u00e9m fazia.<\/p>\n Alguns podem-se questionar, mas n\u00e3o existe j\u00e1 o desconto dos infant\u00e1rios que foi iniciativa do governo? Existe um desconto sim, mas onde est\u00e1 o espa\u00e7o nos infant\u00e1rios? J\u00e1 estou em lista de espera h\u00e1 dois anos e sem fim \u00e0 vista. Tendo em conta que esse tal desconto s\u00f3 se aplica at\u00e9 aos quatro anos, parece que vou usufruir nada ou pouco. Portanto, \u00e0s m\u00e3es que n\u00e3o querem ficar em casa e que querem procurar criar a sua carreira \u2013 resta pagar. Para al\u00e9m dos custos elevados de infant\u00e1rio e educa\u00e7\u00e3o, seguem-se ainda as atividades extracurriculares que tamb\u00e9m n\u00e3o s\u00e3o baratas. Uma parte positiva de Toronto, \u00e9 que a cidade aposta em programas gratuitos para crian\u00e7as, mas tal como acontece com os infant\u00e1rios, as vagas enchem rapidamente, tornando-se mais a exce\u00e7\u00e3o do que a regra aqueles que conseguem desfrutar destas iniciativas gratuitas, ainda mais porque os hor\u00e1rios s\u00e3o pouco realistas para quem trabalha. Depois contem tamb\u00e9m com as sa\u00eddas em fam\u00edlia. O Governo canadiano contribui ainda mensalmente com um abono por cada crian\u00e7a e que leva em conta os rendimentos do agregado familiar, mas desengane-se quem acha que isso \u00e9 neg\u00f3cio \u2013 e se algu\u00e9m pensa que se deve capitalizar filhos, ent\u00e3o fa\u00e7am-nos\/lhes um favor e n\u00e3o os tenham. N\u00e3o sou da opini\u00e3o que o governo deve financiar tudo para as crian\u00e7as, at\u00e9 porque quem toma a decis\u00e3o de os ter s\u00e3o os pais, ent\u00e3o os pais \u00e9 que s\u00e3o os respons\u00e1veis e n\u00e3o devem levar esta como uma decis\u00e3o leviana de quem compra um carro. Contudo, viver em Toronto n\u00e3o \u00e9 f\u00e1cil para ningu\u00e9m, mas est\u00e1 a tornar-se pior para as fam\u00edlias \u2013 isso \u00e9 um facto.<\/p>\n Cada m\u00e3e tem em si tr\u00eas tipos de m\u00e3es: a que diziam que iam ser na altura em que estavam gr\u00e1vidas e que rapidamente percebem n\u00e3o ser realista; a m\u00e3e que gostariam de ser e, por fim, a m\u00e3e que conseguem ser, seja por limita\u00e7\u00f5es pr\u00f3prias ou do ambiente que a rodeia. Acho que ser m\u00e3e nunca foi f\u00e1cil, mas parece ser cada vez mais dif\u00edcil (para quem n\u00e3o tem ajuda). Ter filhos exige muito, n\u00e3o \u00e9 para quem gosta de se colocar em primeiro, \u00e9 preciso levar o altru\u00edsmo a outro n\u00edvel. E tendo filhos, \u00e9 preciso pensar em como se quer cri\u00e1-los, com que valores e em que sociedade. Neste momento, para o que eu pretendia, Toronto n\u00e3o \u00e9 o s\u00edtio certo, pelos pontos que mencionei e pelo esp\u00edrito consumista que se incute nas crian\u00e7as desde cedo, a falta de contacto com a natureza, o desequil\u00edbrio entre vida pessoal e trabalho, a falta que faz ter uma fam\u00edlia grande por perto. Se Toronto continuar a caminhar por esta estrada, nos pr\u00f3ximos cinco anos, al\u00e9m de olhar a parte financeira, terei de ponderar se este \u00e9 o tipo de ambiente que quero que a minha filha absorva \u2013 e neste momento, a resposta \u00e9 n\u00e3o.<\/p>\n
\nN\u00e3o se preocupem depois come\u00e7am na escola, pensava eu \u2013 e agora \u00e9 a\u00ed que vem a maioria das minhas preocupa\u00e7\u00f5es. Primeiro, que financeiramente continuamos a pagar, ningu\u00e9m que trabalhe a tempo inteiro conseguir\u00e1 ter a flexibilidade de ir p\u00f4r as crian\u00e7as na escola \u00e0s 8h30 e ir buscar \u00e0s 15h30. Pior que o hor\u00e1rio s\u00f3 mesmo a qualidade da educa\u00e7\u00e3o que para um pa\u00eds de \u2018primeiro mundo\u2019 deixa muito a desejar. Com a pol\u00edtica de passar todos os alunos de ano, independentemente do seu desempenho escolar – suponho que para se livrarem deles mais cedo – s\u00e3o formados alunos que sabem muito pouco e que n\u00e3o criaram bases para enfrentar um mercado laboral competitivo. Mas h\u00e1 op\u00e7\u00f5es privadas, se as fam\u00edlias conseguirem suportar o gasto mensal de 4,000 d\u00f3lares por filho. Ou seja, mais de 400,000 d\u00f3lares at\u00e9 completarem o ensino secund\u00e1rio e depois ainda se seguem os estudos universit\u00e1rios. Para agravar o n\u00edvel de preocupa\u00e7\u00e3o com o ensino, basta ler as not\u00edcias e ficar a par do n\u00edvel de viol\u00eancia que alunos e professores vivem em ambiente escola. Forma-se o futuro da sociedade como se estiv\u00e9ssemos na selva, onde a \u00fanica lei \u00e9 a do mais forte.<\/p>\n