Viagens

O Japão e a nova era Reiha

O imperador Akihito abdicou no dia 30 de abril, a favor de seu filho mais velho, Naruhito, após 30 anos no poder, a primeira vez que tal aconteceu na história do Japão. Assim terminou a era Heisei. Uma nova, chamada Reiha, cujo significado é ordem e harmonia, se inicia com Naruhito. Gosto da tradição japonesa de começar do zero com a mudança de poder imperial – uma nova era, um novo estado de espírito e muita esperança de renovação.
Chegar ao Japão, situado no exótico oriente, com língua e costumes muito diferentes dos ocidentais, não é fácil, dada a lonjura e os custos que uma viagem implica. Apesar disso, durante muitos anos, sonhei viajar até esse arquipélago que conhecia apenas dos filmes populares de samurais e gueixas.

Tinha aprendido na escola que os portugueses foram os primeiros caucasianos a chegar ao Japão, na primeira metade do século XVI, para comerciar e cristianizar. Um filme recente, “O silêncio”, do americano Martin Scorsese, veio relembrar ao mundo a expulsão dos jesuítas e a trágica história dos cristãos nessa época. Francisco Xavier, chegado em 1549, e seus seguidores, levaram a sua fé a esse mundo estranho, onde dominavam os cultos xintoísta e budista, e pagaram um preço elevado.

Já estava a viver em Toronto, quando fiz amizade com uma estudante japonesa que me convidou a ir ao Japão e ficar em casa de seus pais, na província de Fukuoka, ilha de Kyushu. Por uma feliz coincidência, aterrei na mesma ilha onde os portugueses tinham desembarcado, em 1543.

As minhas primeiras impressões, sobre o que vi ao chegar, foram um misto de surpresa e deceção. No caminho do aeroporto de Fukuoka até Kurume, a pequena cidade onde iria ficar uma semana, só vi prédios modernos, cimento e muitos sinais de néon.

Sem falar japonês, fiquei totalmente dependente da Yuki, como minha intérprete. O que acabei por conhecer da região foi através dos olhos dela e de seus pais, que não falavam uma palavra de inglês, mas foram extremamente amáveis e me levaram a vários passeios. Trocámos muitas ideias com a ajuda indispensável da filha.

Naturalmente, falei com a família sobre a história e a presença dos navegadores portugueses. Interessava-me saber se eles tinham também aprendido na escola sobre o assunto. A mãe da Yuki ouviu-me com atenção e convidou-me a ir a uma pastelaria onde pediu “bolo Castella” (ou Kasutera). Fiquei maravilhada! Era uma espécie de pão-de-ló, com uma fita de papel à volta onde se contava a chegada dos “narizes compridos”, a maneira como identificavam os portugueses. É uma receita antiga, com mais de 400 anos e a especialidade de Nagasaki, porto que os japoneses abriram aos portugueses na época. Foi uma forma bonita de me fazer sentir em casa.

Uns dias depois, fui dar um passeio com a Yuki e duas suas colegas da universidade. As jovens queriam mostrar-me a “louça dos portugueses” numa enorme fábrica de cerâmica na região de Arita. Pensei ter entendido mal, pois o inglês delas não era muito fluente. A minha surpresa e entusiasmo ao ver a loiça, recompensou-as! Havia chávenas, pratos, bules e outros objetos decorados com a figura de homens ocidentais, de cabeleira e vestidos com gibões, tal como era costume no século em que os portugueses lá chegaram. Não resisti a comprar chávenas de chá para trazer de recordação.

Durante a semana que passei no país, tive oportunidades raras de conviver só com japoneses e de não ver um único turista – movimentei-me apenas em espaços destinados aos locais, desfazendo assim a impressão inicial de deceção. Valeu inteiramente a pena ter visitado o Japão que a maioria dos turistas desconhece.

Manuela Marujo

Imagens cedidas por Manuela Marujo

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