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Deixas em troca de queixas

Aida Batista

Não é novidade para ninguém da minha geração que, durante os muitos anos da ditadura, a emigração era oficialmente proibida. A lei, citando uma recente afirmação de muito mau gosto de um taxista, serve para ser violada. Não sei se os emigrantes conheciam esta máxima, mas praticaram-na anos a fio com estratagemas que lhes permitiam furar a lei. A salto, e nas mãos de passadores sem escrúpulos, foram tratados como mercadorias que, na clandestinidade do silêncio da noite, eram levadas para o outro lado da fronteira, e entregues à sua própria sorte, que muitas vezes lhes ditou  a morte, em locais tão esconsos, que até o direito a sepultura lhes foi negado.Não é novidade para ninguém da minha geração que, durante os muitos anos da ditadura, a emigração era oficialmente proibida.

A lei, citando uma recente afirmação de muito mau gosto de um taxista, serve para ser violada. Não sei se os emigrantes conheciam esta máxima, mas praticaram-na anos a fio com estratagemas que lhes permitiam furar a lei. A salto, e nas mãos de passadores sem escrúpulos, foram tratados como mercadorias que, na clandestinidade do silêncio da noite, eram levadas para o outro lado da fronteira, e entregues à sua própria sorte, que muitas vezes lhes ditou  a morte, em locais tão esconsos, que até o direito a sepultura lhes foi negado.Para além desta que, não sendo clandestina, ainda se mantém, há uma outra  constituída por gente altamente habilitada, fruto dos Erasmus, bolsas e a própria globalização do trabalho, que deslocaliza empresas de acordo com os benefícios fiscais daí retirados.  Dominam línguas estrangeiras, servindo-se do inglês como língua internacional, sempre que o país aonde vão parar esteja fora do universo das línguas que conhecem. Normalmente, são recrutados para funções especializadas e recebidos com um mínimo de condições básicas, que lhes permite uma mais fácil integração nos países de acolhimento.

Acrescentem-se  as novas tecnologias que, ao alcance de um clique, permitem dar a conhecer aos que deixaram todos os pormenores dos seus quotidianos. Pese embora o facto de, esta nova geração em mobilidade sofrer de alguns dos problemas que marcaram a emigração dos anos 50/60 do século passado – sentimento de ausência, saudade (os beijos e abraços digitais são desprovidos de toque e calor humano), desenraizamento, relação de pertença -, a verdade é que nunca se pode comparar em termos de conforto e qualidade de vida. Por outro lado, há também que ter em conta que a atual mobilidade pressupõe escolhas (apesar de nem sempre estarem implícitas), enquanto a anterior foi empurrada pela miséria e a matemática da fome, que obrigavam a dividir uma sardinha por dois ou três. É verdade que os primeiros foram esquecidos durante anos e que o país nunca se preocupou com uma definição de políticas de apoio a estes párias da Pátria. Perdoem-me a crueldade das palavras, mas até eram amiúde olhados com desdém e desprezo  pelas autoridades a quem competia defendê-los, mas que não se coibiam de os parodiar entre colegas do mesmo ofício. Não é por acaso que alguns membros do corpo diplomático veem com reserva a sua colocação em postos onde exista uma forte comunidade portuguesa.

Sabemos que nem sempre é fácil, porque o português, que a tudo se sujeita em terra alheia, não para de reclamar logo que se sente em solo pátrio, como é o caso dos consulados e das embaixadas. Umas vezes, com razão; outras, nem por isso!Alguns, quando visitam Portugal – e eu passei por essa experiência muito recentemente – queixam-se de que o país não lhes dá  a importância que merecem. Se já tiveram razão para o fazerem, é bom que agora admitam que a situação está a mudar. Não na quantidade e qualidade que desejariam, mas novos caminhos começaram a ser trilhados. Ora, quando estas queixas me são feitas por quem, por dever de ofício, deveria conhecer o que presentemente se está a passar, eu dou-lhes “deixas” para a troca. A título de exemplo, e só no espaço de um mês: Fundação Gulbenkian, 27/28 de Outubro, Congresso Internacional – Migrações e Relações Interculturais na Contemporaneidade; lançamento a 9 de Novembro de “Olifaque – uma farsa em emigrês”, de João Magueijo; Lisbon&Sintra Film Festival, de 17 a 26 de Novembro, onde esteve presente José Vieira, o cineasta da emigração portuguesa, e foram exibidos dois dos seus filmes; a 22, no Centro Cultural Gil Vicente, projeção do filme “Todos os sonhos do mundo” (leia-se a sinopse, é sobre a nossa diáspora); dia 28, na Sociedade de Geografia, Colóquio promovido pela Comissão de Migrações sobre o tema “Mobilidade Forçada e Solidariedades”. E estes são apenas aqueles de que tive conhecimento e se restringem a uma determinada área geográfica, porque, de certeza que no resto do país se realizam muitos outros eventos. Basta fazer uma breve pesquisa pela NET. Está lá tudo!Deixemos de viver nas nossas ilhas interiores, para nos voltarmos a arquipelegar (verbo creditado a Adelaide Freitas) em torno de questões que abram os caminhos do diálogo com dois sentidos.

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