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Samuel Úria: O Trovador

Créditos: DR.

Samuel Úria nasceu no interior de Portugal, entre as serras do Caramulo e da Estrela. Rodeado de montanhas, silêncio e tradição. Foi exatamente nesse cenário discreto e longe dos grandes centros urbanos que começou a desenhar-se uma das vozes mais singulares da música portuguesa contemporânea. Cantor, compositor, guitarrista e letrista, Samuel Úria é um artista completo. Mistura referências do fado, do blues, do rock, do gospel e da música tradicional portuguesa, sempre com uma atenção especial à palavra. 

Com humor, ironia e muita sensibilidade, cria canções, cheias de imagens inesperadas e jogos de linguagem. Antes de iniciar uma carreira a solo, Samuel integrou várias bandas do circuito alternativo português. O seu percurso começou no final dos anos 90 e início dos anos 2000, ligado a projetos de estética punk e rock, como os Velhos. A rebeldia desses estilos deixou marcas na sua música, no seu som, na sua atitude e na forma intensa como encara a criação artística.  O seu início a solo deu-se entre 2008 e 2010, com lançamentos como o EP Em Bruto e os álbuns Nem Lhe Tocava e A Descondecoração de Samuel Úria. Gravados e distribuídos de forma independente, esses primeiros discos revelaram um artista com uma identidade muito própria: letras afiadas, sonoridade crua e uma entrega visceral. Era o início de um caminho que rapidamente chamou a atenção de um público atento à qualidade. Com o tempo, Samuel Úria conquistou uma base de fãs fiel. Sem grande exposição mediática, sem ser figura constante em rádios ou televisões, as suas canções circulavam por entre quem o descobria em concertos, na internet ou por recomendação. Era, como se costuma dizer, um artista de culto. Em 2013, chegou o disco que o colocou definitivamente no radar da música nacional: O Grande Medo do Pequeno Mundo. Este trabalho representou um salto, tanto na produção como na ambição artística. Samuel trouxe consigo nomes consagrados da música portuguesa, como Manel Cruz, Márcia, Miguel Araújo e António Zambujo. Apesar das diferenças entre esses artistas, todos encontraram um espaço comum na música de Úria. Ele tem esse dom: fazer pontes entre mundos. Canções como “Teimoso”, “Não Arrastes o Meu Caixão” ou “Barbarella e Barba Rala” tornaram-se hinos dos seus espetáculos. Há nelas uma mistura entre o absurdo e o sublime, entre o amor e a crítica social. 

A sua forma de escrever combina referências eruditas com linguagem popular, resultando em letras que fazem rir, pensar e, por vezes, chorar. Ao vivo, Samuel Úria transforma cada concerto numa experiência singular. Com ou sem banda, os seus espetáculos são intensos, emotivos, mas também leves e cheios de humor. Ele sabe conduzir o público, fazendo com que cada música seja mais do que uma canção: seja uma partilha. A sua presença em palco é marcada por uma combinação rara de humildade e segurança. Não precisa de artifícios nem de grandes produções. O que conta é a verdade com que canta e a sinceridade com que fala. O público sente isso — e responde com atenção e entusiasmo. Em 2016, Samuel Úria lançou Carga de Ombro, talvez o seu disco mais conhecido. O título da canção que dá nome ao álbum resume bem a sua filosofia artística e humana: “Põe o teu ombro junto ao meu, carga de ombro é legal”. É uma imagem de união, de partilha de forças e também de resistência. Este disco trouxe canções como “Dou-me Corda”, “Repressão” e a já referida “Carga de Ombro”, onde participa a vocalista Manuela Azevedo, dos Clã. O dueto entre os dois é memorável, criando uma das canções mais bonitas da música portuguesa recente. 

A crítica rendeu-se ao álbum, e Samuel ganhou um espaço mais firme na rádio, na televisão e nas listas dos melhores do ano. O vídeo animado de “É Preciso Que Eu Diminua”, realizado por Pedro Serrazina, também foi alvo de elogios, mostrando como a música de Samuel Úria inspira outros criadores a desenvolver novas formas de arte. Chamar a Samuel Úria apenas de “cantautor” seria uma simplificação. Ele é um pensador, um poeta moderno, um provocador bem-humorado. Apesar de todo o reconhecimento, Samuel continua fiel a si próprio, não se deixou moldar por modas ou pressões do mercado; continua a compor e a atuar com a mesma paixão com que começou. 

A sua música é um espaço de liberdade criativa, onde tudo cabe: Deus e o Diabo, o riso e o choro, o rock e o fado. Hoje, Samuel Úria apresenta o espetáculo 2000 A.D., baseado no disco homónimo. Este projeto fala da viragem do milénio e o que ela representou para uma geração que cresceu com promessas de progresso, mas que encontrou um mundo mais complexo do que esperava. Neste novo trabalho, continua a explorar temas profundos com ironia e lirismo. As canções, como sempre, provocam e encantam. O espetáculo ao vivo, cheio de simbolismo e energia, mostra que Samuel Úria continua em plena forma — criativamente inquieto e artisticamente comprometido.

Paulo Perdiz/MS

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