José D’Almeida (1965-2022) – Um Artista, um Mestre o Génio
José d’Almeida nasceu em 1965, em Lisboa, mas sempre se considerou um provinciano e um cidadão do mundo. Genial artista dos sete ofícios e multifacetado, frequentou design e artes gráficas na Escola António Arroio. Pintor e fotógrafo autodidata, expõe desde 2001. Nos seus trabalhos podemos vê-lo, como mestre ou como discípulo. Os detalhes das suas obras convidam a navegar num mar de surpresas e emoções.
Ganhou a medalha de bronze na categoria de Ilustração, no ano de 2017, na World Photografic Cup. Um autodidata com a particularidade muito rara de ter vários artistas incorporados num só, assim como a sua arte se desdobrava em várias artes (desde a contemporânea à arte concetual), onde utilizava o corpo como potência máxima para expressão de sentimentos dúbios, como a dor, angústia e prazer. Utilizava a tecnologia, os meios digitais e edição gráfica, como grandes aliados, o desenho, a pintura e a fotografia como forma de comunicação, a arte e a vida com espírito contestador, investiga em si o eu, não no sentido único, mas sim de grande dualidade. Um visionário, que chegava a tocar o irónico, o dramático, humorístico com parábolas.
Meticulosamente, construía-a ele mesmo todos os artefactos e adereços de que necessitava, fazendo depois a composição dos mesmos, utilizando-os nas suas inquietudes criativas místicas, para provocar reações, obrigando-nos a questionarmo-nos constantemente.
Assim tornava a arte mais próxima da vida, através de uma junção de várias linguagens, sendo uma forma de aceitar ou desistir, de viver ou de morrer, deixando na sua obra a sensação de experiência única, em que nos perdemos. Na leitura dos seus trabalhos que nos presenteava, ele conseguia tocar o nosso íntimo, divertindo-se, conseguia uma sensação de que se queria ver mais e mais! Um artista, um mestre de temáticas surreais, um génio completo como nenhum.
Numa noite como qualquer outra noite, José d´Almeida escreveu: “É tarde, ou será cedo…. A minha mente não sossega, a inquietude que me acompanha no meu dia a dia está no seu ponto mais alto, acendo um cigarro. As luzes da cidade permanecem ligadas, as casas vão adormecendo e as energias retomam a mim. Agora sim estou pronto para trabalhar … continuo a movimentar as minhas mãos, mas estas ainda não me obedecem … seguem a sua tarefa ainda não sei que estou a construir, volto ao computador e outra música se inicia. O meu amor já dorme … mais energia se desloca a mim … Os objetos que neste preciso momento construo ainda não sei bem o que são, mas tudo a seu tempo. Sei que preciso de continuar neste meu pensar com as minhas mãos … sei que elas e apenas elas me levarão ao ponto que preciso chegar. Novamente me dirijo ao computador e coloco outra música a tocar, acendo outro cigarro ou como a Maria diz ligo outro cigarro. Sei que tenho de deixar de fumar tanto, mas, não consigo.
Uma criatura de vícios. Gosto tanto deste silêncio, consigo ouvir-me mesmo sem falar … consigo ouvir a sua voz … José precisas de alguma coisa? .., sei que me quer ajudar mas só me perturba, não é que não goste da sua presença mas, preciso mesmo de continuar a trabalhar …” E num click tudo se quebrou … O homem desapareceu, o ser humano, o artista ficará para sempre no coração dos que verdadeiramente o quiseram conhecer, os que verdadeiramente o amaram.
A sua obra é impossível de descrever, cada elemento uma descoberta, todo um mundo imaginário e mágico a descobrir, o seu mundo. A obra torna-se o seu corpo invisível, a materialização desse corpo estabelece-se a partir de fragmentos de histórias imaginárias, recriadas através de cenários por si construídos e fotografados. Esses cenários eram apropriados por personagens e objetos do espectro da imaginação. Deste modo, a narrativa cénica incorporava-se no espaço e tempo real. Um click captava o momento na frente da objetiva, e nesse mesmo click a “criatura” por detrás da objetiva também se deixava capturar. Nessa dança encerra-se uma história. José era o narrador das suas histórias feitas de imagens, não se ficando apenas pela realidade aparente da fotografia, mas acrescentando-lhe uma outra dimensão que era a “sua” dimensão. Numa fase posterior do processo criativo não menos importante, José por vezes sentia a necessidade de desconstruir a fotografia. Uma outra imagem surgia na sua mente, o real e o fictício aproximam-se de forma mágica.
O surrealismo torna-se um denominador comum nas suas fotografias; José agarrava aquilo que o realismo lhe transmitia e extravasa-o oniricamente, enriquecendo esse realismo com o imaginário.
A fotografia artística/criativa é para José o seu “corpo” invisível que ele anseia que seja cada vez mais uma realidade observada… sentida… José provocava a fotografia, da mesma forma que gostaria que está provocasse ou beliscasse a consciência e sensibilidade de cada um…
Pode ver O Poeta da Luz uma exposição temporária no Museu do Vinho Bairrada, Anadia patente até 31 de maio.
Fontes:Museu do Vinho Bairrada,Anadia, Maria Salvador Arquiteta e Helena Costa
Paulo Perdiz/MS
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