Peter Fonseca, de 54 anos, natural de Alcanena (distrito de Santarém), está no Canadá desde 1969. Aqui cresceu e com ele cresceram sonhos que, depois de muita dedicação, se foram tornando reais. Como o próprio diz, o primeiro passo é acreditar.
Apaixonado pelo atletismo desde muito novo, com um incentivo e apoio incondicional do seu pai, Peter decidiu dedicar-se a este desporto, tendo sempre em vista uma meta muito especial: a dos Jogos Olímpicos. E assim foi: em 1996, Peter Fonseca representou o Canadá nos Jogos Olímpicos de Atlanta, nos Estados Unidos, ocupando o 21º lugar. Essa prova tinha o maior número de países já representados: eram no total 79. Uma competição que contou com 124 atletas inscritos, sendo que apenas 111 concluíram o percurso de 42.195 km.
Os Jogos Olímpicos de Atlanta de 1996 foram marcados por um início muito emocionante, mas também trágico. Se por um lado o mundo inteiro aplaudia o lendário Muhammed Ali a acender a Tocha Olímpica, por outro, próximo do local das principais instalações da competição, onde havia uma área aberta, conhecida como Parque Olímpico do Centenário, uma bomba explodiu e duas pessoas acabaram por morrer, enquanto que outras 111 ficaram feridas.
Hoje Peter Fonseca, atual MP em Mississauga, fala-nos dos tempos que viveu intensamente nas Olimpíadas e ajuda-nos a perceber como estará o espírito dos atletas que se encontram já em Tóquio, para uma competição muito pouco “normal”, mas que continuará a ser, para quase todos, o cumprir de um sonho.
Milénio Stadium: Conte-me um bocadinho sobre a sua ligação ao atletismo? Como surgiu essa paixão?
Peter Fonseca: Sempre adorei o desporto e a magia dos Jogos Olímpicos provavelmente começou aos nove anos de idade, enquanto assistia aos Jogos Olímpicos de Montreal de 1976. O meu pai era um entusiasta do desporto e deu-me a oportunidade de experimentar uma grande variedade de desportos: futebol, hóquei, natação, atletismo, ciclismo, só para citar alguns.
O atletismo foi uma oportunidade para ter um tempo especial com o meu pai. Falávamos sobre o jogo, corrida ou treino a caminho da competição e depois conversávamos sobre como se tinha corrido durante viagem de regresso a casa.
A minha ligação ao atletismo e a minha paixão pelo desporto estão intimamente ligadas ao meu pai e ao seu apoio para me ajudar a atingir todo o meu potencial no desporto, bem como na vida.
MS: Como foi o percurso até chegar aos Jogos Olímpicos?
PF: Digo sempre que se deve acreditar em algo antes de se poder alcançá-lo. Visualizar-me a representar o Canadá nos Jogos Olímpicos começou como um jovem atleta. Eu terminava uma corrida ou treino e na minha cabeça imaginava-me no estádio olímpico ou a competir contra os melhores do mundo. Para fazer algo a um nível elevado é preciso trabalhar arduamente, é preciso ser disciplinado, ter perseverança e uma atitude de quem nunca vai desistir. Houve muita prática e aprendizagem com o(s) meu(s) treinador(es) e outras pessoas sobre como me tornar melhor.
Ao longo da jornada atlética de um olímpico haverá muitos fracassos. Os insucessos são alguns dos melhores blocos de construção e motivadores, porque se aprende a melhorar, aprende-se a levantar de novo, a continuar a trabalhar arduamente e eventualmente assim chegamos ao nosso objetivo. Para resumir tudo isto, chegar aos Jogos Olímpicos requer uma equipa de apoio de treinadores, pais, amigos. Algum talento natural, trabalho árduo e um pouco de sorte.
MS: O que significou para si na altura, chegar aos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996?
PF: Os Jogos Olímpicos de Atlanta, tornar-me um Olímpico e ter uma Canadian Maple Leaf no meu uniforme foi um dos momentos mais orgulhosos da minha vida. Participar nos Jogos Olímpicos é o sonho de qualquer atleta e exige uma enorme determinação, disciplina e longos anos de treino.
MS: Que memórias tem dessa experiência?
PF: Tenho provavelmente duas memórias favoritas, e ambas são a entrar no Estádio Olímpico. A primeira é a cerimónia de abertura olímpica, com as multidões nas bancadas, os fogos de artifício, Muhammad Ali a acender a Tocha Olímpica e atletas de todas as nações do Mundo a entrar juntos. A segunda memória é atravessar a linha de chegada da Maratona Olímpica no Estádio Olímpico em frente de familiares e amigos, como evento final dos Jogos Olímpicos antes das cerimónias de encerramento.
MS: Estamos no início de uns Jogos Olímpicos atípicos, depois do adiamento do ano passado. Chegámos agora ao início dos Jogos com a pandemia ainda a obrigar um estado de emergência no Japão e também a impor a ausência de público em todos os estádios. Da sua experiência, consegue imaginar o que sentem os atletas que estão nesta situação?
PF: Os atletas, tal como todos os outros no mundo inteiro, têm vivido com esta pandemia provocada pela COVID-19 durante um ano e meio. Tem tido impacto em toda a gente e isso inclui a vida dos nossos atletas olímpicos de alto rendimento. Compreendo os desafios dos Jogos Olímpicos de Tóquio, sendo este um ano pandémico, estes serão por isso Jogos diferentes. Não haverá adeptos nos estádios. Não haverá família para aplaudir os atletas. A cidade anfitriã está em estado de emergência, etc. No final, posso dizer que, enquanto antigo Olímpico, o meu sentimento pessoal é de que o atleta quer fazer o que faz de melhor: competir. Creio que todos os atletas tiveram uma vacina dupla e que os protocolos de segurança mais elevados estão a ser utilizados em Tóquio para manter todos o mais seguros possível, mas permitindo que os Jogos Olímpicos avancem.
MS: A realização dos Jogos Olímpicos deste ano, ainda nestas circunstâncias de pandemia, que motivações reais têm? Serão motivações político-económicas, mais do que desportivas?
PF: Sim, podemos falar acerca do Comité Olímpico Internacional, dos patrocinadores e dos milhares de milhões de dólares gastos nos Jogos. Não vou especular sobre as verdadeiras motivações para a realização dos Jogos Olímpicos, mas o que posso dizer é que para os atletas é um evento que só acontece “uma vez na vida para muitos deles”.
A minha esperança é que a motivação para realizar os Jogos Olímpicos se baseie na crença e no sonho dos milhares de atletas olímpicos que trabalharam arduamente para alcançar este ponto culminante.
MS: A equipa canadiana apresenta este ano a maior equipa desde 1984. São 371 atletas no total. Como se sente como ex-atleta Olímpico canadiano com esta representatividade do país nos jogos olímpicos deste ano?
PF: Acho espantoso que tenhamos um contingente tão grande da Team Canada. Tem sido um ano e meio muito stressante para os atletas alcançarem os difíceis padrões de qualificação devido à falta de oportunidades de competição, bem como o acesso a locais de treino devido à pandemia. Mostra a perseverança dos nossos atletas e a sua capacidade de resistência para superar tantos desafios.
MS: Que esperanças relativamente aos resultados dos atletas canadianos?
PF: Estarei a torcer por toda a Team Canada e espero que os nossos atletas dos vários desportos sejam capazes de dar o seu melhor e, assim o espero, trazer para casa medalhas olímpicas. Estou realmente ansioso por ver o mais jovem nadador e atleta olímpico canadiano, Summer McIntosh, de 14 anos, que está pronto a surpreender o mundo pelo Canadá. Go Canada Go!
Catarina Balça/MS
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