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“Numa perspetiva internacional, o Canadá é um país desenvolvido com elevadas taxas de pobreza e desigualdades relativamente elevadas” – Peter Graefe

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O Canadá é considerado um dos países mais ricos do mundo. Contudo, os números registados pelos Bancos Alimentares atingiram um recorde de 1,5 milhões de utilizadores em março passado. Como se explica uma situação destas? O que se passa com o país de oportunidades para todos? Estas e outras questões tornam-se absolutamente legítimas e as respostas têm que passar por diversos tipos de análise e a perspetiva de um investigador da área social, com especialização em ciência política, afigurou-se-nos como essencial. Afinal, esta é uma questão que terá que ter obrigatoriamente uma decisão ao nível do poder governativo do país, seja provincial ou federal.

Peter Graefe, professor associado da McMaster University, concretamente no departamento de Ciência Política da Faculdade de Ciências Sociais, aceitou dar-nos a sua perspetiva sobre esta realidade e começou por sublinhar que “não é apenas a riqueza de um país, mas a forma como é distribuída (e redistribuída) que afeta coisas como a utilização dos bancos alimentares. Se as pessoas dependerem do seu trabalho para poderem alimentar-se e pagar o seu alojamento, terão problemas se os salários não acompanharem o aumento do preço dos alimentos e do aluguer. Por outro lado, o sistema terá também problemas em cuidar de pessoas que não conseguem trabalhar ou encontrar trabalho.

No Canadá urbano, as rendas aumentaram tão rapidamente que as pessoas que trabalham com ou em torno do salário mínimo têm muitas vezes pouco dinheiro para a alimentação e por isso podem ter de utilizar bancos de alimentos. Mais importante ainda, as taxas de assistência social para os desempregados e pessoas com deficiência não aumentaram tão rapidamente como a inflação na última década, de modo que os beneficiários de assistência social em muitos casos não têm dinheiro suficiente para se alimentarem”.

E se a situação já é difícil neste momento, a tendência será para piorar atendendo à previsão feita pelo Banco do Canadá que aponta para uma recessão nos primeiros meses de 2023, como bem sublinha o professor da McMaster University – “A situação social tende a piorar numa recessão, uma vez que o desemprego retira rendimentos às famílias, o que por sua vez aumenta o stress no seio das famílias à medida que estas tentam fazer face às despesas. As pessoas que estão desempregadas também perdem o seu impulso no mercado de trabalho, uma vez que correm o risco de perder as suas competências ou podem ter de aceitar um emprego para o qual estão sobre qualificadas. As recessões são uma época em que as pessoas precisam mais do que nunca do apoio do governo, mas como os governos veem as suas receitas fiscais diminuir (de menos pessoas empregadas e menos atividade económica), estes são muitas vezes momentos em que tentam cortar os apoios”.

Um verdadeiro círculo vicioso parece desenhar-se com este quadro de crise acentuada. No entanto, as grandes empresas continuam a apresentar contas com registos de lucros bastante elevados e há uma franja da população que continua a dar mostras de riqueza no seu modo de vida. Estará o Canadá a tornar-se um país de acentuado desequilíbrio social? Peter Graefe responde-nos assim: “numa perspetiva internacional, o Canadá é um país desenvolvido com elevadas taxas de pobreza e desigualdades relativamente elevadas. Tem sido assim desde pelo menos os anos 90, quando o sistema de seguro de desemprego foi reformado para poupar dinheiro, e as taxas de assistência social foram reduzidas com o argumento de que isso ajudaria as pessoas a encontrar trabalho. As recessões tendem a aumentar a desigualdade, pelo que podemos esperar que o Canadá continue neste caminho de elevada pobreza/alta desigualdade”.

O estudo recentemente revelado pelos Bancos Alimentares aponta também que as crianças, os idosos e as pessoas com qualquer tipo de deficiência são as que mais sofrem com este quadro económico. A pergunta impõe-se – o que deve ser feito pelos vários níveis de governo para contrariar esta tendência? Na resposta que nos deu, Peter Graefe recorda uma das promessas do atual governo federal, não cumprida até ao momento – “as prestações infantis melhoradas (tais como o abono de família pós-2008 do Ontário ou o abono de família melhorado do Canadá) demonstraram ter um forte efeito na redução da pobreza infantil. O atual governo federal liberal prometeu desenvolver um Canada Disability Benefit para melhorar igualmente os rendimentos das pessoas que vivem com uma deficiência, e para facilitar a estas pessoas o trabalho remunerado sem se preocuparem em perder os seus benefícios. Até à data, não demonstraram muito interesse em cumprir esta promessa, mas isso representaria um importante passo em frente”.

Madalena Balça/MS

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