Mulheres sacrificam carreiras para se dedicarem à família
O tema não é novo, mas com a comemoração do Dia Internacional da Mulher a 8 de março, o papel da mulher no mercado de trabalho e na vida familiar volta a ganhar destaque nos meios de comunicação social nacionais e internacionais. Este artigo não se foca no papel da mulher no mercado de trabalho, mas sim na sua dedicação à família e aos filhos. O Milénio Stadium ouviu a história de duas mulheres que abandonaram a carreira para se dedicar a 100% à família.
Daniela Longaray era professora de canto e cantora antes de engravidar, mas desde que foi mãe não voltou à vida profissional. “Sou formada em jornalismo, mas não exerço. Em 2018 emigrei para o Canadá e durante alguns meses cantava em eventos, mas depois acabei por parar porque era muito cansativo. As aulas de canto sempre foram o meu principal rendimento e quando engravidei estava a dar aulas em duas escolas de Toronto”, contou.
Casada e mãe de uma menina com 16 meses, Daniela nunca adiou o sonho de ser mãe por causa do foco na vida profissional, mas compreende que algumas mulheres o façam. “Casei em 2011, mas já namorávamos desde 2003. A ideia de virmos para o Canadá foi justamente para criarmos uma família. No Canadá sabia que ia poder estar em casa nos primeiros anos de maternidade. E no Canadá a nossa filha tem mais qualidade de vida do que no Brasil”, disse.
A jovem mãe tem hoje 34 anos e tem a certeza que “a maternidade é o trabalho mais importante do mundo”. “Cuidar de um ser humano desde o dia zero, um ser que vai fazer parte do mundo, socializar com outros adultos, no futuro. A infância marca de qualquer jeito, seja para o bem e para o mal, sempre entendi que esse tempo seria vivido de forma plena”, afirmou.
Embora seja mãe há apenas 16 meses, se fosse hoje Daniela voltava a fazer o mesmo. “Nunca me arrependi, já é comprovado que uma criança que tem cuidadores em que ela sente total confiança vai torná-la mais confiante e segura na vida de uma forma geral. Quanto mais apegada a mim ela é mais eu sei que fiz um bom trabalho, pois ela sente confiança de que, não importa o que aconteça, eu estarei ali para ela”, adiantou.
A pandemia trouxe benefícios para toda a família porque com o teletrabalho o marido de Daniela passou a ser um pai ainda mais presente. “No Brasil o meu marido trabalhava das 9H às 7:30H e chegava a casa por volta das 8:30H, o que faria ele ser inevitavelmente um pai ausente. No Canadá ele vive a 10 minutos do trabalho e devido à pandemia agora está em teletrabalho, o que fez com que fosse ainda mais presente”, avançou.
O facto de o casal não ter família no Canadá tornou a parentalidade ainda mais desafiante, mas nem isso os demoveu. “Claro que é difícil, ser mãe expatriada não é fácil. Mas tem aspetos muito bons, no início exige dedicação a 100%, não apenas a nível físico, mas também emocional. Mas eu sabia disso tudo e estava tranquila com a minha decisão. A vida é feita de ciclos e eu sabia que este ciclo seria assim”, referiu.
Carmen Carvalho interrompeu a carreira para ajudar a filha a criar o neto. Depois de trabalhar como assistente administrativa na Câmara Municipal de Toronto durante 14 anos, Carmen dedicou-se a 100% ao primeiro neto.
Filha única, quando o pai teve uma trombose, Carmen voltou para Portugal e ficou lá um ano até o pai falecer. “Acabei por trazer a minha mãe para o Canadá porque ela não podia estar sozinha. Já estava num avançado estado de demência e era totalmente dependente para os cuidados do dia a dia. Nessa altura na nossa casa tínhamos quatro gerações e a entreajuda entre nós fez com que construíssemos uma ligação muito forte”, sublinhou.
Carmen reconhece que as condições de apoio à parentalidade têm melhorado no Canadá, mas admite que o cenário ideal para que ambos os pais pudessem trabalhar seria existir mais creches e a preços mais acessíveis.
Hoje com 67 anos, Carmen tem dois filhos e cinco netos com idades entre os 10 e os 18 anos. A antiga assistente administrativa não julga quem recorre a lares de idosos, mas no seu caso não foi uma opção. “A minha mãe faleceu em 2018, mas quando ela ficou dependente senti que o melhor era ser eu própria a tomar conta dela. Mas reconheço que não é uma opção para todos e o importante é que quem cuide esteja disponível a nível físico, emocional e financeiro e que saiba que existem profissionais que nos podem ajudar. Não me arrependo de ter abdicado de uma maior reforma e de ter restrições de tempo para lazer, foi de livre vontade”, partilhou.
Sobre o equilíbrio entre ser mulher, cuidadora e avó, Carmen defende tudo é compensador quando há apoio familiar. “Ser avó é mais fácil porque os pais traçam as regras, aos avós só cabe apoiar e mimar. Ser cuidadora é muito difícil porque há inversão dos papéis naturais, mas tudo se resolve com amor e apoio”.
O último relatório da Mediacorp Canada de 2021 comparou as empresas canadianas que são mais amigas das famílias e chegou a esta conclusão: 20 empresas lideram o ranking de empresas mais amigas das famílias em todo o país. A lista é bastante diversificada e vai desde empresas de telecomunicações até seguradoras. Para citar apenas algumas: Banco do Canadá, Bell Canada; Desjardins; Hospital for Sick Kids; KPMG; Salesforce; Toyota Canada e Universidade de Toronto.
Os programas e as iniciativas que as empresas desenvolvem para equilibrar os compromissos profissionais e familiares foi um dos tópicos analisados para criar este ranking. Licença de maternidade e parental; assistência na creche; programas para dias de folga pagos; flexibilidade de horas; licença para ajudar familiares idosos; assistência na adoção; assistência reprodutiva, incluindo medicamentos para fertilidade e fertilização in vitro e até bolsas de estudo para filhos de funcionários.
Na lista das empresas canadianas mais amigas das famílias em 2021, as medidas de apoio às famílias são várias. A auditora KPMG oferece aos funcionários um generoso subsídio de adoção (até $20.000) e apoia novas mães com pagamentos complementares de licença-maternidade até 100% do salário durante 17 semanas (mais de quatro meses). O Regulador de Energia do Canadá ajuda a sua equipa a equilibrar os seus compromissos familiares através de horários de trabalho flexíveis, até cinco dias de licença familiar remunerada por ano (para consultas familiares e responsabilidades relacionadas) e até 15 dias de licença médica remunerados anualmente.
Mas há até quem vá mais longe e ajude com despesas para tentar engravidar. A Canada Mortgage and Housing Corporation (CMH) oferece vários apoios para a família, que vão desde generosos subsídios de fertilização in vitro (até $20.000) a maternidade e licença parental complementar para novas mães e pais (incluindo pais adotivos).
Joana Leal/MS
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