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Luso-canadiano poderia ter sido uma das vítimas mortais de McArthur

Maior investigação forense da história da polícia de Toronto

Um luso-canadiano poderia ter sido uma das vítimas mortais de Bruce McArthur que foi condenado a prisão perpétua pelo homicídio de oito homens há duas semanas. Jorge da Costa tem 56 anos e é um ativista dos direitos da comunidade LGBT em Toronto.
Na leitura da sentença o juiz disse que se McArthur não fosse detido provavelmente teria continuado a matar. A comunidade LGBT está chocada com o caso, mas defende que é preciso seguir em frente sem esquecer.


Jorge da Costa contou ao Milénio Stadium que chegou a ser abordado por McArthur em aplicações para encontros gays, bi, trans e queer. “Em 2016 ele abordou-me no Grindr e explicou-me que gostava de BDSM (Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo). Eu disse-lhe que não estava interessado, mas recordo-me de ter sido abordado de novo por ele noutras aplicações”, adiantou.
Mas o ativista dos direitos da comunidade LGBT já conhecia a cara de Bruce McArthur de outras paragens e revelou-nos que conhecia três das vítimas mortais. “Eu sempre frequentei bares da Gay Village, entre a Weslley e a Gerard St, e ele andava muito nesses bares. Ele parecia ser uma pessoa muito calma e na comunidade gay até lhe chamávamos o Santa Claus (pai Natal). Nunca o vi ter nenhum comportamento abusivo e infelizmente conhecia três das vítimas”, referiu.

Jorge alerta para os perigos dos encontros online, “porque na realidade nunca sabemos bem quem está do outro lado” e recomenda muita cautela. “Acho que devemos criar códigos de segurança e combinar com alguém da nossa confiança falar a uma determinada hora para saber se o encontro correu bem ou se estamos em perigo de vida”, sugeriu.
Ao nosso jornal lamentou o preconceito que ainda existe em relação à comunidade LGBT e sublinha que ainda há muita gente desaparecida. “O comportamento deste homem faz lembrar o de alguém que tem vergonha de assumir que é gay, o que não faz nenhum sentido nos dias de hoje. Mas, infelizmente, ainda há por aí muito recalcamento, até na própria comunidade portuguesa… Todos os anos desaparecem cerca de 100 mil pessoas no Canadá e algumas nunca são localizadas. A sociedade tem de estar mais alerta e colaborar com as autoridades. É estranho que os vizinhos de McArthur não tenham notado comportamentos atípicos…”, disse.

Jorge defende que “agora é tempo de virar a página e de seguir em frente”, mas “sem nunca esquecer a brutalidade e a frieza destes crimes”.
Bruce McArthur tinha 67 anos e trabalhava por conta própria em jardinagem. As vítimas terão morrido entre 2010 e 2017 e esta foi a maior investigação forense da história da polícia de Toronto.

A cronologia do caso McArthur

A primeira vez que McArthur e a polícia se cruzaram foi em outubro de 2001. Na altura, ele agrediu várias vezes um homem que morava na área gay da cidade, com um tubo de metal. O homem chamou a polícia e foi levado para o hospital. Depois, McArthur viria a entregar-se à polícia à qual terá confessado a agressão sem explicar o motivo.
Três anos depois, em abril de 2003, McArthur declara-se culpado num assalto com arma e é proibido pela justiça canadiana de se aproximar de uma determinada área da cidade, que incluía a área gay.

Em setembro de 2010 McArthur é visto a sair de um bar gay na Church e Carlton St na companhia de Skandaraj (Skanda) Navaratnam. A partir desse dia Skanda, de 40 anos e natural do Sri Lanka, nunca mais foi visto.

Em dezembro de 2010 Abdulbasir Faizi de 42 anos e funcionário de uma gráfica em Mississauga é dado como desaparecido na Polícia Regional de Peel. Mais tarde o seu carro é encontrado abandonado em Toronto, na área da St. Clair E e Mount Pleasant Rd.

Em outubro de 2012 Majeed Kayhan, um imigrante afegão de 58 anos, é dado como desaparecido pelo filho. Em novembro a polícia começa a operação “Project Houston” e encontra algumas evidências do homicídio de Navaratman. A tese policial sugere que terá sido vítima de canibalismo e McArthur nunca foi suspeito durante toda a investigação.

Em agosto de 2015 Soroush Mahmudi, um pintor de 50 anos, é visto vivo pela última vez na sua casa perto da Markham Rd e Blakemanor Blvt em Scarborough. Para além dos três homens acima referidos, segundo a polícia, em 2015 McArthur terá também morto Kirushna Kumar Kanagaratnam de 37 anos, um refugiado do Sri Lanka.

Em junho de 2016 a polícia recebe uma chamada do 911, o número de emergências do Canadá, e um homem garante que McArthur o tentou estrangular no seu carro durante um encontro consensual. Na sequência desta denúncia, McArthur entrega-se à polícia, mas é libertado sem acusação formal.

Em abril de 2016 Dean Lisowick, de 47 anos, é visto pela última vez no Scott Mission, uma instituição que apoia pessoas carenciadas. Segundo a polícia, McArthur terá morto Lisowick a 23 de abril de 2016.

Em abril de 2017 Selim Esen, um cidadão turco de 44 anos, é dado como desaparecido e, de acordo com a polícia, McArthur terá morto Esen a 16 de abril de 2017. Em junho do mesmo ano Andrew Kinsman, de 49 anos e residente em Cabbagetown, também é dado como desaparecido. Mais tarde a polícia conclui que Kinsman e McArthur estavam numa relação e segundo as autoridades McArthur matou Kinsman a 26 de junho de 2017.

Em agosto de 2017 a polícia cria a operação “Project Prism” para investigar o desaparecimento de Esen e de Kinsman. A informação acaba por ser partilhada com o “Project Houston”. Em setembro de 2017 McArthur é considerado suspeito da morte de Kinsman e a polícia coloca o carro de McArthur sob vigilância. Em dezembro de 2017 o chefe da polícia de Toronto, Mark Saunders, afasta a hipótese de serial killer, apesar do elevado número de desaparecidos na Gay Village. Numa conferência de imprensa Saunders garante aos jornalistas que “não existem evidências que relacionem os desaparecimentos”. Entretanto, a equipa que investiga o homicídio de Kinsman consegue autorização para entrar em casa de McArthur e passa a pente fino o seu computador pessoal.
Em janeiro de 2018 McArthur é preso e é acusado da morte de três homens: Kayhan, Mahmudi e Lisowick. A polícia revela que encontrou ossos em vasos de plantas que deverão ser dos três homens que foram desmembrados. A casa estava localizada junto a Leaside, onde McArthur trabalhou como jardineiro.

Em fevereiro de 2018 a polícia volta a encontrar restos mortais de seis pessoas noutros vasos de plantas que estavam na mesma casa. Através de impressões digitais e de dentes a polícia descobre os restos mortais de Kinsman, de Navaratnam e de Mahmudi. McArthur é detido e em maio de 2018 a polícia conclui quatro meses de investigação forense ao apartamento onde McArthur morava no Thorncliffe Park. A polícia recolheu 1,800 provas e tirou mais de 18,000 fotografias – é a maior investigação forense da história da polícia de Toronto.

Em junho de 2018, quando McArthur está sob vigilância, a polícia encontra na sua residência um homem atado que é referido no processo como “John”. McArthur é preso e acusado do homicídio de Esen e de Kinsman. Os investigadores acreditam que podem existir outras vítimas e começam a procurar em propriedades de McArthur em Toronto e em Madoc, em Ontário.

Bruce McArthur – Créditos: DR

McArthur condenado a prisão perpétua

Em julho de 2018 a polícia faz escavações numa área verde localizada nas traseiras do apartamento e encontra todos os dias restos de corpos humanos e identifica Kaylan, uma das vítimas.
Em outubro de 2018 McArthur enfrenta a sua primeira audiência preliminar e em novembro o julgamento é marcado para 6 de janeiro de 2020. A 29 de janeiro de 2019 McArthur considera-se culpado dos oito homicídios em primeiro grau. O juiz John McMahon antecipa o julgamento para 4 de fevereiro e McArthur é condenado a prisão perpétua. McArthur está impedido de sair em liberdade condicional antes de cumprir 25 anos de pena.

O juiz argumentou que McArthur estrangulou as vítimas, tirou fotos aos seus corpos que estavam sem roupa e guardou as imagens no computador para vê-las depois dos crimes. Depois de desmembrar os corpos colocava os restos mortais dentro de plantas em áreas residenciais onde guardava o equipamento de trabalho ou numa área verde atrás da casa onde residia.
“McArthur é um predador sexual e um assassino que atraía as suas vítimas com o pretexto de sexo consensual e que acabava depois por matá-las para a sua própria gratificação, distorcida e doentia”, disse o juiz na leitura da sentença.

As vítimas eram de origem sul asiática e do Médio Oriente e algumas delas viviam vidas paralelas devido à sua orientação sexual.

Joana Leal/MS

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