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Canadá admite ter sido cúmplice de ‘genocídio racial’ de mulheres indígenas

O Canadá foi cúmplice de um “genocídio racial” contra mulheres indígenas, segundo um extenso relatório produzido pelo próprio governo canadiano.

O texto, divulgado no dia 3 de junho, cita dados de uma pesquisa mostrando que as mulheres indígenas tinham 12 vezes mais hipóteses de serem mortas ou desaparecerem do que outras mulheres no Canadá.

Produzido ao longo de três anos, o relatório de 1.200 páginas apresenta mais de 200 recomendações, entre elas um apelo para todos os canadianos ajudarem a acabar com a violência, inclusive aprendendo a história indígena.
O relatório constatou que “as violações e abusos persistentes e deliberados dos direitos humanos dos indígenas são a causa básica por trás das taxas de violência do Canadá”.

Baseado em audiências e pesquisas, entrevistas sobre violência desproporcional enfrentada por mulheres e meninas indígenas no Canadá, o estudo culpa o colonialismo radicado e a falta de ações do Estado.

“Apesar de terem diferentes circunstâncias e origens, todos os desaparecidos e assassinados têm em comum a marginalização económica, social e política, pelo racismo e pela misoginia entremeados no tecido da sociedade canadiano”, afirmou a comissária-chefe do inquérito, Marion Buller.

Pressão por investigação

O estudo, com custo estimado em US$ 92 milhões, concentrou-se nas causas sistémicas da violência contra as mulheres indígenas, e em recomendações de medidas públicas e formas de prevenção.

Foram ouvidas mais de 2.000 testemunhas desde 2017 – incluindo sobreviventes de violência e seus familiares.
As descobertas do Inquérito Nacional sobre Mulheres e Meninas Indígenas Assassinadas e Desaparecidas eram aguardadas com bastante expectativa no Canadá, onde há cerca de 1,6 milhão de indígenas – o país tem 37 milhões de habitantes.

Casos notórios de mulheres e meninas indígenas desaparecidas ou assassinadas ampliaram a antiga pressão por uma investigação nacional – entre eles, as mortes cometidas pelo serial killer Robert Pickton e a morte da estudante Tina Fontaine.

Em 2014, o relatório Mulheres Aborígenes Desaparecidas e Assassinadas: Uma Visão Nacional fez estimativas sobre o número de mulheres indígenas desaparecidas e assassinadas entre 1980 e 2012. Foram identificados 1.017 homicídios registados pela polícia e 164 sem registo.

Isso significa que as mulheres indígenas são alvo de 16% do total de homicídios femininos, embora representem apenas 4,3% da população feminina do país.

Reações

O primeiro-ministro Justin Trudeau – que anunciou ter colocado a reconciliação com os povos indígenas como uma prioridade do seu governo – estará presente na cerimónia de conclusão do inquérito, iniciado após anos de pedidos de organizações indígenas e internacionais.

As famílias que perderam entes para a violência – e os próprios sobreviventes – terão agora mais informações para cobrar medidas de reparação e prevenção.

Embora o foco do inquérito fosse sobre mulheres e meninas, os investigadorestambém incluíam muitas referências a pessoas com dois géneros, lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros, queer, intersexuais e assexuais. Eles observam que esses grupos também têm sido alvos frequentes de violência.

Inquéritos e investigações anteriores no Canadá – desde a Royal Commission of Aboriginal Peoples, de 1996, até ao mais recente relatório Verdade e Reconciliação – apresentaram cerca de 900 recomendações abrangentes para lidar com muitos dos problemas ligados à questão. Mas grande parte delas não saiu do papel.

Essa falta de ação do Estado é citada no fim do relatório divulgado há pouco.

“Um dos maiores medos de sobreviventes e familiares é de se abrirem para um processo tão intenso quanto este ligado ao inquérito e nada ser feito – o relatório fica a acumular pó numa prateleira e as recomendações são deixadas sem resposta.”

Para a chefe do inquérito, Marion Buller, é preciso uma mudança de paradigma no país para desmontar o colonialismo na sociedade canadiana. “Leia o relatório, manifeste-se contra sexismo, machismo e misoginia. Cobre ao governo e descolonize-se a si mesmo aprendendo sobre o povo indígena e a verdadeira história do Canadá”, sugeriu Buller aos cidadãos canadianos.

Quais são as recomendações do relatório?

– O governo central e os administradores provinciais devem desenvolver um plano de ação para combater a violência contra mulheres indígenas, meninas e pessoas LGBT;
– Desenvolver um plano de ação nacional para garantir o acesso equitativo a emprego, habitação, educação, segurança e saúde;
– Estabelecimento de um ombudsman nacional de direitos humanos e indígenas;
– Governos devem reconhecer e proteger os direitos dos idiomas indígenas e darem-lhes status de idioma oficial;
– Todos os níveis de governo devem garantir apoio a programas e serviços para mulheres e meninas indígenas na indústria do sexo;
– Aumento do financiamento para serviços policiais indígenas;
– Governo central deve rever e reformular as leis sobre violência sexual e contra parceiros íntimos;
– Criação de um mecanismo independente para relatar anualmente como as recomendações estão a ser implementadas.

BBC

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