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As promessas liberais e conservadoras sob o olhar de um contabilista

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Créditos: DR.

A essa altura, com a corrida eleitoral se aproximando do fim – 20 de setembro é o último dia para os canadianos exercerem o seu direito ao voto -, muitos já escolheram quem pretendem que os represente em Ottawa para os próximos anos. Na disputa pelo controle do poder, mais uma vez, chegam à frente e com mais chances de serem eleitos os Partido Liberal e o Conservador. Nos últimos meses os eleitores tiveram a chance de conhecer as principais propostas e promessas de ambos para diversas áreas, tais como mudanças climáticas, moradias acessíveis, recuperação econômica pós-pandemia, criação de empregos, melhorias no setor da saúde, cobrança de impostos e programas de creches tendo dominado a cena.

Mais do que promessas, as propostas feitas por esses candidatos nesses diferentes setores vão de fato impactar a vida de todos os cidadãos. Por isso, para analisar mais a fundo algumas das diferenças entre elas, e o que irão representar se de fato postas em prática, contamos com a participação do contabilista e especialista fiscal, Sergio Ruivo, que com sua ampla experiência no setor, tem mais de 30 anos de atuação, analisou os diferentes cenários que uma vitória de Justin Trudeau ou Erin O’Toole representará em especial no setor econômico, ou seja, no bolso das famílias e das empresas canadianas, fortemente afetadas pela pandemia.

COBRANÇA DE IMPOSTOS

Milénio Stadium: Em relação ao imposto sobre rendimentos (singular e coletivo), uma das principais propostas dos Liberais é aumentar os valores cobrados sobre aqueles que ganham mais, como por exemplo bancos e seguradoras com altos faturamentos e criar uma regra para que aqueles que ganhem mais paguem ao menos 15%, independente das deduções. Já os Conservadores propõem lançar uma revisão abrangente do sistema tributário para melhorar a competitividade, reduzir as taxas e simplificar as regras. O que podemos esperar dessas propostas?

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Sérgio Ruivo, contabilista e especialista fiscal. Crédito:DR

Sergio Ruivo: Em relação à proposta dos Liberais, não sou contra aumentar a carga fiscal sobre os bancos e seguradoras, mas duvido muito que vão conseguir alcançar as receitas que pretendem, porque são organizações altamente sofisticadas e com certeza vão conseguir alterar a situação para manter a carga fiscal igual.  Em relação a cobrar uma taxa mínima de 15% acho um absurdo. Já existe uma regra fiscal chamada Aternative Minimum Tax (AMT) que limita as deduções quando são desproporcionais ao rendimento bruto. A proposta conservadora faz mais sentido, porque o nosso país tem problemas de competitividade em geral, e um sistema fiscal altamente complexo e confuso, que é bom para mim como contabilista e especialista fiscal, mas mau para negócios e indivíduos.  Em outros países o que foi claramente demonstrado é que quando simplificas o regime fiscal e travas os buracos de escape, as receitas fiscais aumentam.

EVASÃO FISCAL

MS: Os dois partidos à sua maneira, dizem que o objetivo é evitar a evasão fiscal que permite aos mais ricos evitar o pagamento dos impostos devidos, o que segundo os Liberais aumentará os recursos para a agência (Canada Revenue Agency) em até CAD $ 1 bilhão por ano. Em relação ao CRA os Conservadores prometem garantir que respeite as pequenas empresas e concentre esforços nos sonegadores de impostos ricos e nas grandes corporações. Isso pode significar uma redução de impostos para as empresas que lucram menos e têm grande parte dos seus rendimentos consumidos pelas taxas cobradas pelo governo?

SR: Os Liberais dizem e prometem muita coisa, mas no fim fazem pouco ou nada.  Quando houve o escândalo dos Panamá Papers há uns anos, constavam lá no mínimo 900 canadianos com dinheiro e investimentos em paraísos fiscais a fugir das suas obrigações fiscais aqui no Canadá.  Sabe quantos daqueles nomes foram investigados pelo CRA nos últimos cinco anos?  Só 1/5 dos casos foram investigados completamente, enquanto 1/5 ainda está em investigação. Aumentar os recursos ao CRA pode dar fruto, mas para quem já está no poder há seis anos, isso já podia ter sido feito. Em relação a proposta dos Conservadores, concordo plenamente. Um incentivo fiscal para investir em pequenas empresas, e de certo modo dar subsídio a novos quadros destas novas empresas seria um enorme estímulo à economia. Com certeza resultaria em maior receita fiscal e mais emprego. Estudos econômicos apoiam este tipo de iniciativa.

ECONOMIA PÓS-PANDEMIA

MS: Em relação a recuperação econômica das pequenas e médias empresas. As promessas dos partidos são muitas nessa área e vão desde os Liberais prometendo a extensão do Canada Recovery Hiring Program até 31 de março do próximo ano, dando crédito aos empregadores que conseguirem novas contratações, oferecer ajuda para treinamento de novos contratos, entre outros. Os Conservadores prometem pagar pelo menos 25% do salário dos novos contratados por seis meses a partir de outubro e até 50%, dependendo de quanto tempo a pessoa está desempregada além de fornecer um crédito fiscal de 15 por cento para despesas de férias de até CAD $ 1.000 para férias no Canadá em 2022. Dessas duas plataformas eleitorais, qual poderia de fato fazer maior diferença para a realidade dos pequenos e médios empresários?

SR: Acho que no fundo há pouca diferença na eventual eficácia das duas propostas de subsídio laboral de ambos os partidos.  Concordo que dar subsídio às empresas para contratar novos quadros seria boa ideia, mas o problema real que enfrentam pequenas e médias empresas é a dificuldade de contratar novos empregados.  O sistema atual está desincentivando as pessoas a trabalhar, ou realmente não há gente suficiente para tal.  Enquanto os subsídios não acabarem de destronar o mercado de trabalho, não vamos saber a razão verdadeira da situação. A ideia de promover turismo no Canadá através de um crédito fiscal de CAD $1,000 acho que é uma excelente ideia para ajudar o setor turístico que foi o mais atacado pela pandemia.  Esta ideia já foi utilizada em outros países como a Itália e Luxemburgo com muito sucesso.

ECONOMIA FAMILIAR-CRECHES ACESSÍVEIS

MS: O que uma vitória dos Liberais ou Conservadores pode representar, de maneira geral, para o bolso das famílias de classe baixa, média e alta canadianas de forma geral? Uma das diferenças de visão que existe é na área de creches infantis. Enquanto os Liberais prometem um plano nacional de creches com custo de $10,00 ao dia, os Conservadores pretendem  criar um crédito fiscal reembolsável que reverteria para os pais até 75 por cento das valores anuais desembolsados pela família com creche.  De modo geral, quais as principais mudanças que analisa estarem por vir?

SR: Para ser sincero, pouco ou nada.  Quem é rico vai continuar a ser rico, a classe média talvez seria a mais beneficiada com a   ajuda para o cuidado dos filhos (dou preferência à proposta Conservadora devido a escolha pessoal), e a classe baixa já tem suportes mínimos que vão continuar, mas duvido muito se o tal rendimento mínimo garantido pela proposta dos Liberais e o DP venha a ser concretizado, para ajudar a melhorar o nível de vida deste grupo.

COMPRA DA CASA PRÓPRIA

MS: A casa própria é um dos temas que gera bastante debate entre os partidos políticos e que interessa imenso à população. No que se diferenciam as propostas dos partidos e quais parecem trazer mais vantagens?

SR: Os Liberais propõem uma taxa de “anti-flipping” para aqueles que compram e vendem a casa durante 12 meses e os dois partidos querem impedir compra de casas por estrangeiros.  Concordo que estas medidas vão ter algum efeito e diminuir a subida nos preços de casas, mas não vai ser muito significativo. Na verdade, só uma crise (fabricada ou natural) é que vai ter o resultado pretendido em tentar reduzir o preço do imóvel no desejado 25% – 30%.

MUDANÇAS CLIMÁTICAS

MS: Em relação ao Climate Change, especificamente sobre a cobrança da taxa de carbono. Os Liberais pretendem manter essa taxa em vigor para as províncias sem um plano próprio e permitir que continue a aumentar para US $ 170 por tonelada até 2030. Já os Conservadores prometem eliminar esse imposto de carbono existente e substituí-lo por contas pessoais de poupança de carbono, o que forçaria as pessoas a pagarem uma conta pelo uso de carbono e então usarem esses fundos para compras ambientalmente corretas.A cobrança por essas contas pessoais de poupança de carbono começaria em US $ 20 por tonelada e aumentaria para não mais de US $ 50 por tonelada. Em relação a esse imposto sobre o carbono, acha que cria empregos em outros setores ou acredita que vai significar o encerramento de algumas empresas e perda de empregos?

SR: Estou totalmente de acordo que temos que tomar ação em relação à mudança climática.  O preço sobre o carbono é algo que é absolutamente necessário, e ambos os partidos têm isso nas suas plataformas.  O problema é o estilo e maneira como cada partido quer lá chegar.  Quanto a mim, não pode ser o governo a tomar as decisões de investimento e encerramento.  Compete ao governo criar as regras e os incentivos para que o mercado defina a mistura de tecnologia, investimento e mudança de hábitos para atingir os objetivos. A meu ver, simplesmente promulgar objetivos de emissões carbónicas mais agressivos do que o outro partido diz pouco.  A realidade é aquilo que foi feito nos últimos seis anos.  E aí, os resultados estão à vista de todos, o Canadá teve o pior recorde dos G7 em redução de emissões carbónicas.

Lizandra Ongaratto/MS

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