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“Ao invés de combatermos o medo, é preciso que o compreendamos”

Tiago Souza

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Créditos: DR

Medo. Uma das emoções mais instintivas do ser humano. Essencial para a nossa sobrevivência e perpetuação como espécie. O medo pode nos paralisar e adiar, ou até impedir, que mudanças e novos rumos sejam tomados, porém, se soubermos lidar com ele e contorná-lo, pode ser um impulsionador e nos encorajar a encarar o desconhecido. 

Basta nos sentirmos ameaçados de alguma forma, e o corpo humano, essa máquina perfeita ao nosso dispor, começa a trabalhar e diversos mecanismos entram em ação. Assim que você reconhece o medo, a amígdala (pequeno órgão no meio do cérebro) começa a funcionar. Ela alerta o sistema nervoso, que coloca em movimento a resposta ao medo do seu corpo. Os hormônios do estresse como cortisol e adrenalina são liberados. Sua pressão arterial e frequência cardíaca aumentam.

Mas afinal, por que sentimos medo? Do que temos medo? Na tentativa de entendermos um pouco mais sobre esse sentimento, inerente ao nosso ser, e desvendarmos de que maneira lidar e saber conviver da melhor forma possível com ele, estivemos à conversa com o psicoterapeuta Tiago Souza. Entre outras questões o especialista esclarece que é preciso identificar e compreender nossos medos para que eles não tomem proporções exageradas e sejam impeditivos além de destacar a importância do tratamento com ajuda de profissionais para aqueles casos mais avançados.

Milénio Stadium: Por que sentimos medo?

Tiago Souza: Todos nós nascemos com a habilidade de sentir medo. É uma das emoções mais importantes para nossa sobrevivência, pois é um dos alertas biológicos que nos sinaliza ameaças e nos prepara para a luta ou fuga. Carregamos esta habilidade como espécie. O medo é um dos sistemas de defesa mais antigos dos seres vivos. Imagine que o medo é responsável para que animais fujam de seus predadores, identifiquem riscos a sua vida e a sua prole, e ultimamente para que haja a perpetuação das espécies.

Nós humanos elaboramos e desenvolvemos esse instinto por milhares de anos. Hoje, já mais maduros tanto emocional e intelectualmente, sentimos medo como reação a perigos reais, potenciais e imaginários.

MS: Quais reações físicas que o medo desencadeia em nosso cérebro e consequentemente em nosso corpo?

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Tiago Souza, psicoterapeuta. Créditos: DR.

TS: Tendo fonte biológica, o medo desencadeia diversas reações físico-químicas: os hormônios adrenalina e noradrenalina são fundamentais no mecanismo do medo.A adrenalina é produzida em situações de grande estresse, e estimula o aumento da frequência cardíaca, contrai os vasos sanguíneos e dilata as vias aéreas (o que aumenta o fluxo sanguíneo para os músculos e oxigênio para os pulmões). Já a noradrenalina é responsável por auxiliar na atenção, concentração e alerta. Em conjunto, esses hormônios fazem nossa respiração aumentar em frequência, nossas pupilas dilatam, nosso coração funciona mais para irrigar o organismo com sangue, e até mesmo nosso sistema gastro-intestinal é esvaziado, nos fazendo mais ágeis e leves no caso de fuga. 

Todas essas reações nos fazem preparados para reagir com eficiência em situações de ameaça a nossa integridade, principalmente quando percebemos que nossa vida está em risco.

MS: Até que ponto o medo pode influenciar negativamente na nossa vida?  

TS: Do ponto de vista da evolução, nossos instintos erram “para mais” do que “para menos”. Isso quer dizer: é melhor confundirmos um pedaço de madeira com uma cobra, do que o oposto, parafraseando o neurocientista Joseph LeDoux, autor do livro The Emotional Brain.

No entanto, quando os níveis de estresse são muito intensos ou prolongados, nosso organismo começa a sofrer consequências adversas, como dificuldade em retornar ao estado de não-perigo. Sinais comuns de excesso de medo ou estresse são a insônia, fadiga, estados de alerta e ansiedade constantes, e em certos casos mais severos a paranóia. 

Muitas das fobias que temos são derivadas dessa tendência a sentirmos medos exacerbados, e da dificuldade que temos em retornarmos a níveis de segurança real ou imaginária.

MS: Existe algo positivo em sentir medo?

TS: Sem dúvida que sim! Além de ser um ótimo mecanismo de sobrevivência, o medo é o protótipo das atitudes cautelosas, do cuidado que desenvolvemos em relação a nós mesmos e aos outros, e é o alicerce biológico de todas as ações voltadas para a promoção de saúde, prevenção de acidentes, e que nos auxilia a sermos atentos a detalhes.

MS: Como podemos combater os diferentes medos que possamos ter?

TS: Ao invés de combatermos o medo, é preciso que o compreendamos. Combater o medo é eliminar uma potencial fonte de proteção a nossa vida. Quando não sabemos o que nos causa medo, ele nos domina e ganha proporções catastróficas em nossas mentes. Na maioria dos casos, convivermos com nossos medos nos faz mais cautelosos e nos ajuda a proativamente evitarmos situações que nos desencadeiem essas reações extremas.

Nos casos mais persistentes, existem terapias efetivas que nos ensinam a responder aos medos de maneira menos reativa, e nos auxiliam a “dialogar” como nossos medos e reeducar nossas percepções. O confronto saudável entre nossos pensamentos catastróficos e a realidade é sempre importante, para deixarmos a reação de luta e fuga, e usarmos nossas capacidades racionais e cognitivas a nosso favor, para controlarmos nossa imaginação. 

MS: A pessoa nasce com algum medo específico ou são as experiências/ vivências que a fazem desenvolver esses temores?

TS: Os dois cenários agem em conjunto. Todos nós nascemos com a capacidade de sentir medos, principalmente os que apresentam riscos mais reais a nossa vida: altura, certos animais, cheiros e imagens que nos assustam. No decorrer de nossas vidas, também somos expostos a experiências traumáticas, medos que nossos familiares nos encutem, e vivências que podem diminuir ou exacerbar esses medos.

Lembremos: há sempre auxílio de profissionais das áreas de saúde física e mental para que nos apropriemos e controlemos nossos temores, e aprendamos a conviver com os riscos inerentes ao viver. Mas se temos medo, é porque a vida vale a pena preservar.

Lizandra Ongaratto/MS

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