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“Acho que os europeus têm mais tempo”

 

Lúcia Melo, nasceu no Canadá, depois de casar viveu uns anos em Portugal e depois foi tempo de viver em França. Esteve por lá 22 anos e voltou com o filho à terra onde nasceu e onde tem as suas raízes. Há 9 anos que está, de novo a viver e a trabalhar em Toronto. Com Lúcia percebemos que há vantagens e desvantagens em todos os sítios que escolhemos para viver e trabalhar, cabe a cada um fazer as escolhas certas no momento certo.

Milénio Stadium: A Lúcia trabalhou cerca de 20 anos em França, apesar de ter nascido no Canadá. Pode contar-me um pouco da sua história de vida?
Lúcia Melo: Eu era estudante no Humber College, no curso de Law & Enforcement Criminalistic. Quando me casei, mudei para Lisboa. Lá, teria que recomeçar um novo curso para obter equivalências escolares, devido às diferenças nas leis. Então, fui para o Norte, na região do Minho, e trabalhei como rececionista. Aceitei a vaga imediatamente, pois havia muitos anúncios no centro de emprego, mas o sistema de concursos tinha muita concorrência, e eu não queria esperar. Adaptei-me bem à vida em Portugal. Era agradável, com muita colheita e criação de animais, o que ajudava a economizar nas despesas com alimentação. Eu tinha galinhas, coelhos e um quintal que adorava.
Depois, decidimos mudar para Paris. Alguns meses depois, meu filho nasceu lá, e tive a sorte de encontrar um trabalho como porteira (superintendente). O contrato oferecia muitos benefícios: salário, segurança médica e a possibilidade de cuidar do meu filho enquanto trabalhava.
Quando meu filho começou na escola primária, comecei a trabalhar numa empresa de importação e exportação de têxteis para comerciantes. Com o tempo, tornei-me assistente de direção e, posteriormente, trabalhei na contabilidade da empresa. Estive então 22 anos em França, a viver e trabalhar. Mas a minha família sempre esteve aqui em Toronto. O meu filho quis regressar para viver com os meus pais aqui no Canadá, porque pronto, sabe como é, o sonho americano, o sonho do Canadá, que isto aqui é tudo melhor. Entretanto, embora a vida em Paris fosse boa, havia muito stress entre os habitantes, com tensões e manifestações constantes. As ameaças de bombas no metro e os atentados, como o do jornal Charlie Hebdo, deixaram-me preocupada com a segurança do meu filho. A situação política parecia instável e piorou com os atentados.
O meu filho sempre sonhou em viver no Canadá, o “American Dream” dos Estados Unidos e Canadá. Quando ele completou 18 anos, veio para cá, e eu também regressei. Os meus pais receberam-nos de braços abertos. Foi maravilhoso estar com meus avós, pais e família novamente. Sentia muitas saudades e voltar à terra onde nasci, após quase 22 anos, foi emocionante.

MS: Tem então a experiência de trabalho aqui no Canadá e a experiência de trabalho fora do Canadá. Sabe bem como é a vida aqui no Canadá e como é a vida num país europeu, quer seja Portugal, quer seja em França. Falou que o seu filho veio atrás do sonho americano. O Canadá é um país de sonho?
LM: Eu sempre ouvi as pessoas a falar que o Canadá e a América eram países de oportunidade. Não é que todos os sonhos se pudessem realizar, mas antes que para ter sucesso e para conseguir qualquer coisa na vida o Canadá e a América eram países que davam uma boa oportunidade para isso.

MS: Mas acha que, por exemplo, França, onde viveu, não é também um país de oportunidade?
LM: Eu tenho que ser muito sincera. França, tem muitas oportunidades, tem muitos benefícios. Uma pessoa que trabalha tem oportunidade de ganhar muito dinheiro. E também tem uma qualidade de vida muito boa.

MS: O que é que quer dizer com isso? Qualidade de vida? Em que aspeto?
LM: Quer dizer, não só por estar num país da Europa não é, também porque tem um clima muito bom, comparado com aqui. Também tem muita cultura, tem muita história. Tem também uma vida com menos stress, acho eu.

MS: Acha que os europeus vivem mais a vida?
LM: Eu acho que os europeus, eles têm mais tempo. Mais tempo para eles aproveitarem para estar em família, para saírem aos fins de semana, têm mais tempo porque têm mais feriados. Não é só o tempo de férias, têm mais feriados, tudo isso também contribui para a pessoa ter um melhor nível de vida. Não é como aqui, sempre, sempre a trabalhar. Acho que aqui é muito stress. Independente do lugar, trabalhar para sustentar uma família e manter um nível de vida equilibrado já é stressante. Acrescentar sobrecarga de trabalho pode prejudicar a saúde. Pessoas que trabalham horas extras continuamente, é porque têm grandes objetivos e muitas despesas. Conseguem viver bem e aproveitar a vida. Tudo depende das escolhas e do modo de vida que desejam levar. É fundamental encontrar um bom equilíbrio.

MS: Dizem os entendidos, a OCDE, neste caso, que as pessoas na América do Norte trabalham mais horas do que os europeus. Da sua experiência pessoal como trabalhadora aqui e trabalhadora em França. Sente que trabalha mais aqui do que trabalhava em França, por exemplo?
LM: Sim. Em França tínhamos no mínimo 35 horas, não é? Aqui acho que é 44. Portanto, já aí há uma diferença. Em França também há pessoas que conseguem trabalhar mais porque fazem vários trabalhos. Isso depende também do objetivo de cada pessoa. Em França houve debates sobre as 35 horas: alguns consideravam um erro, outros defendiam a lei. Estudos mostraram que cidades europeias com menos horas de trabalho têm menos stress, enquanto cidades asiáticas, norte-americanas e sul-americanas, com mais horas, são mais stressadas. Um empregado trabalha menos horas, mas dá mais esforço e o trabalho é melhor. Ou seja, um trabalhador trabalha menos, mas é mmais produtivo.

MS: Se não fosse o seu filho querer vir para o Canadá, a Lúcia ainda estaria em França?
LM: Não. Quer dizer, eu vim mais por razões pessoais, para estar com a família e com o desejo dele vir, viemos os dois. O Canadá é considerado um dos melhores países do mundo, com muitas ofertas de emprego que abrem portas para o crescimento profissional e oferecem muitas oportunidades e apoio. Muitas vezes, as pessoas não estão cientes de todos os serviços disponíveis, por isso é essencial uma boa comunicação para que todos conheçam e saibam com o que podem contar.

MS: Há pouco falou de o tempo ser melhor em França… acha que o facto do tempo ser mais agradável, puxar as pessoas mais para a rua, acaba por também contribuir para que as pessoas vivam de uma outra maneira?
LM: Quer dizer, a vida lá é agradável para certas pessoas, porque também há quem viva em dificuldade. Não é tudo um mar de rosas, não é? Depende da vida de cada um. Eu estou muito feliz que meu filho tenha escolhido viver no Canadá. Desde o meu regresso, há 9 anos que trabalho como auxiliar numa escola e num infantário. Embora me sinta mais cansada aqui, talvez devido aos horários, idade ou clima, estou contente por estar de volta. O Canadá oferece muitas oportunidades e ajuda, mas é importante conhecer o funcionamento da economia do país, o nível de vida, a estrutura escolar, os impostos aplicados e as reduções no salário. É crucial pensar nos descontos para o sistema de saúde e para a reforma. Compreender as leis e o governo de um país é importante antes de decidir trabalhar, alugar ou comprar uma propriedade. Existem muitos direitos e apoios dependendo da situação de cada um: trabalhadores, desempregados, empresários, estudantes ou reformados. Nos últimos anos, os preços dos imóveis, sejam para compra ou aluguel, estão caríssimos. As despesas e taxas também são muito elevadas, e os aposentados queixam-se constantemente sobre o aumento do custo de vida. Comparado com há 20 anos, manter o mesmo padrão de vida tornou-se um desafio com a economia e os salários atuais. A qualidade de vida parece estar a diminuir, e muitos esforçam-se para manter um estilo de vida que antes era mais acessível. Apesar desses desafios, com resiliência e adaptação, é possível encontrar maneiras de manter uma boa qualidade de vida. Melhor gestão financeira, aproveitamento das oportunidades de emprego e acesso aos serviços de apoio são essenciais para buscar equilíbrio e estabilidade perante as dificuldades económicas atuais.
MB/MS

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