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25 de Abril, sempre!

25 de abril - milenio stadium
Artur Jesus • Ex-Combatente – Creditos: Luciano Paparella Jr.

 

Portugal antes de 25 de Abril de 1974 – um país cinzento, fechado ao mundo, massacrado pela falta de liberdade e por uma guerra colonial imposta pelo regime totalitário. A guerra que ceifou a vida de tantos, levou tantos outros a fugir do país para não participarem numa guerra que consideravam injusta e inaceitável.

Artur Jesus foi chamado a cumprir o serviço militar em outubro de 1972. Depois seguiu-se o percurso habitual – recruta, especialidade – até que chegou a hora e a ordem mais temida – foi mobilizado para o Ultramar, Angola, em 73. Um momento marcante, Artur Jesus confessa que “senti, senti medo. Quando parti dos Açores levei dor no coração. Nunca tinha viajado, quase 10 horas de voo, de Lisboa para Luanda. Eu que estava habituado a viajar entre ilhas, meia-hora, 20 minutos… já em Angola senti medo”. Apesar do medo, por lá ficou até concluir a sua missão em abril de 1975.

Hoje Artur Jesus vive em Toronto e pertence à Associação de ex-Combatentes e tem também uma profunda ligação à Associação 25 de Abril, com muito orgulho. Foi com ele que conversámos sobre essa madrugada que tantos esperavam. Em Angola o 25 de Abril chegou a 26, também de madrugada. Companhia formada e o Capitão a gritar “tenho uma grande surpresa para vos dar”, foi assim que Artur Jesus e os seus companheiros de armas souberam o que estava a acontecer.

Depois da alegria e do pensar que a guerra tinha terminado, veio a notícia de que a missão iria continuar. Do mato, no norte de Angola, Artur Jesus e os seus companheiros viajaram até à capital – “depois da Revolução fomos para Luanda e lá passámos um mau bocado. Lá foi complicado. A guerra passou a ser entre civis, na própria população angolana. Os 42 homens angolanos que faziam parte da nossa companhia, lutavam ao nosso lado, quando chegou a essa altura… foi difícil para eles. Em Luanda sofremos um bocado, mas Luanda precisava de tropas para apoiar e proteger os civis”.

Artur Jesus não tem dúvidas de que “a guerra colonial foi um desastre enorme para Portugal, além das baixas, além dos inúmeros deficientes das Forças Armadas, em 14 anos de guerra Portugal gastou 21,7 mil milhões de euros”. Foi para acabar com uma guerra injusta e desastrosa para o país que os militares fizeram cair o governo de Marcelo Caetano.

Com a Revolução nasceu a democracia e surgiram as mudanças há muito ambicionadas. Artur Jesus fala-nos de algumas das mais importantes “a Revolução beneficiou muito o nosso país. Se não fosse a Revolução de Abril pôr um fim à Guerra Colonial hoje andavam muitas mais mães de família de luto. O 25 de Abril trouxe o direito à igualdade, trouxe liberdade e fez com que a Mulher que era considerada, apenas uma perfeita dona de casa, fosse libertada para poder começar a encontrar um emprego. Este foi um ponto muito importante”.

A ditadura tinha a PIDE como braço armado, que se misturava por entre as vidas dos cidadãos comuns, sempre à procura de sinais de movimentos antirregime. As prisões, as torturas, aterrorizavam todos, que passaram a viver amordaçados, porque como bem recorda Artur Jesus “antes do 25 de Abril não se podia falar. Podíamos falar em casa, mas não podíamos falar na rua. Eu que vivia a ditadura sei o que foi a minha infância… ter que andar duas horas para ir para a escola, descalço. Na escola os mais pobres eram discriminados. Os mais abastados mantinham as professoras com ofertas e alguns não eram tão inteligentes como os mais pobres, mas conseguiam passar”. Aquilo que hoje consideramos direitos básicos como a liberdade de escolha de quem nos governa era na altura uma verdadeira farsa. Artur Jesus conta um dos muitos episódios que viveu: “fui com o meu pai, que me levou pela mão, num dia de eleições à Junta de Freguesia para ele votar. Quando chegámos, estava lá o presidente da Junta que disse ao meu pai (que era conhecido por Mestre) “Mestre não se esqueça da mão esquerda”. Era a caixa dele. Tinha-se que votar ali”.

Hoje vivemos em liberdade, numa democracia em permanente construção, com os seus defeitos e virtudes, mas em liberdade. Isso não tem preço, principalmente para quem viveu tantos anos sem saber o que isso era.
Quando Portugal viveu aquele “dia inicial inteiro e limpo”, como escreveu Sophia de Mello Breyner, explodiu de alegria, gritando “somos livres!”. Com a sabedoria que o tempo e tudo o que se vive intensamente confere, Artur Jesus, distingue o conceito de liberdade de hoje, com o que se viveu no período pós-revolucionário – “a liberdade hoje é diferente, o antes do 25 de Abril foi o terror. Naqueles primeiros anos a liberdade também não foi muito boa. O povo abusou um bocadinho. Sabe… Portugal teve um sono longo, de 41 anos… Os jovens hoje nunca vão compreender, eles vivem na liberdade, mas nunca vão compreender, nós os velhos é que temos que lhes transmitir o que foi a ditadura. Por isso é importante que o 25 de Abril não morra. Porque o 25 de Abril hoje em Portugal é um feriado nacional. É um dia que se estiver bom “vamos para a praia”. A juventude não quer saber do 25 de Abril, querem o feriado”.

Tão verdade, tão tristemente verdade. Por isso, é fundamental continuarmos a gritar “25 de Abril, sempre!”

Madalena Balça/MS

Nota: Brevemente poderá ver esta entrevista na Camões TV

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