Luís Barreira

Não há trabalhadores portugueses?…

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Créditos: saadx8

Na passada semana, todo o painel mediático dos jornais e televisões portuguesas, para além da referência ao aumento dos casos Covid em Portugal e das medidas restritivas que possam vir a ser acionadas, referia-se à dificuldade em conseguir trabalhadores portugueses para um largo conjunto de atividades económicas.

Associações empresariais ligadas ao: turismo, agricultura, têxtil, vestuário, calçado, construção, mobiliário, restauração e pescas, reclamavam das grandes dificuldades em encontrar trabalhadores disponíveis para estas áreas económicas. Situação que, não sendo recente, se agravou com a retoma económica após o confinamento e o relançamento destas atividades, muitas delas ligadas à exportação, fazendo perigar o seu desenvolvimento e a manutenção de contratos já efetuados.

Representantes de várias associações setoriais solicitaram ao governo que tomasse medidas urgentes que incentivassem à contratação de profissionais para atividades ditas “tradicionais”, que sofrem de alguns “estigmas” que as tornam pouco atrativas para a população trabalhadora mais jovem, ao mesmo tempo que denunciavam o envelhecimento atual da mão-de-obra de certos setores e a consequente falta de jovens especializados. Tudo isto num contexto em que se estão a promover internacionalmente os nossos produtos em variados mercados, que demorámos muitos anos a conquistar, e sem saber se podemos dar continuidade aos contatos realizados e às respetivas encomendas.

Para obviar a esta situação as associações de empregadores salientam a necessidade de adequar o ensino às necessidades das empresas, melhorando a “relação entre a oferta e a procura de talentos” e, no imediato, alterar a legislação que permita a realocação dos reformados em certas atividades em que estão especializados, assegurando a curto prazo uma melhor capacidade de resposta das empresas, face ao aumento significativo das suas encomendas.

Segundo os empregadores, uma outra forma de apaziguar a escassez de recursos humanos em certas atividades como a construção ou a agricultura, sem condicionar as suas atividades, é recorrer a trabalhadores estrangeiros. No entanto, vieram ser congelados os fluxos internacionais desses trabalhadores, devido à pandemia de Covid-19.

Este assunto que não é novo, suscitou-me alguma admiração, sem me surpreender! Embora neste curto texto não se possa dar toda a dimensão às causas e formas de ultrapassar a gravidade desta situação tentarei, através dos elementos conhecidos pelo senso comum, salientar alguns dos aspetos correlacionados com este problema.

Após o 25 de Abril de 1974 e durante muitos anos, abandonou-se a formação profissional do ensino secundário e só muito recentemente se começaram a dar os primeiros passos num ensino profissionalizante parcelar e nem sempre direcionado para as atividades ditas “tradicionais”, mas com sucesso atual. Resultado…

A política de baixos salários de muitas das empresas que agora reclamam não ter trabalhadores suficientes, não é atrativa para quem procura emprego. A este propósito convém salientar que, segundo dados do Pordata em 2019, 11% da população empregada era considerada pobre, ou seja, os seus rendimentos eram inferiores ao limiar do risco de pobreza, notando-se uma grande disparidade salarial entre os vários setores de atividade, onde a construção, a agricultura, as pescas, o alojamento e a restauração, têm os vencimentos mais baixos, inferiores a 1.000 euros.

Também o envelhecimento da população contribui para a escassez de trabalhadores que tem sido referida pelas empresas. Numa população que há anos tem uma muito fraca taxa de natalidade, por razões que também se prendem pela incapacidade das camadas mais jovens da população ativa poderem prever o futuro, quando o seu presente se encontra condicionado por contratos a prazo ou a recibos verdes, era expectável o envelhecimento da nossa população que, segundo projeções, chegará a 2050 com 1,6 pessoas em idade ativa por cada idoso, o que implica que as migrações vão ser determinantes. No entanto, não se pense que os idosos portugueses abandonam a atividade mais cedo do que noutros países da União Europeia porque, comparando com a média da taxa de atividade dos maiores de 64 anos na UE (5,7%), Portugal regista o dobro.

Por outro lado, verificamos que existem 351.667 indivíduos inscritos nos centros de desemprego e que 32.000 são da construção, setor que precisa de cerca de 70.000. A resposta a esta aparente contradição pode estar nos fracos salários e na desqualificação desta atividade, tornando-a pouco atrativa e na falta de capacidade dos serviços da nossa Segurança Social em controlar a empregabilidade dos desempregados a seu cargo. Refira-se igualmente que muitos trabalhadores poderão ainda estar a receber o subsídio de desemprego, porque as durações máximas destes subsídios oscila entre 12 e 24 meses. Para além disso, a falta de fiscalização a que antes me referi, sobre este setor de atividade tão diversificado, faz proliferar o chamado “trabalho a negro” que, associado ou não ao subsídio de desemprego, permite aumentar o rendimento de muitos trabalhadores no desemprego, fazendo-os desistir da procura de emprego.

Para além de 48% dos portugueses, com idades entre os 25 e os 64 anos, não terem completado o ensino secundário e terem baixos níveis de escolaridade e de qualificações profissionais, o que lhes diminui a oferta de emprego em setores mais especializados e exigentes, a nossa atual população ativa mais jovem é mais qualificada do que a mais velha e, logicamente, não procura empregos com níveis de qualificação mais baixos.

Se juntarmos ao número de desempregados inscritos nos centros de emprego, todos aqueles que não sendo considerados como tal, enquanto frequentam o ensino profissionalizante subsidiado, todos aqueles que desistiram de procurar emprego e vivem dos “biscates a negro” ou da ajuda familiar e os cerca de 260.000 jovens ativos “nem-nem”, que nem estudam, nem trabalham, a realidade portuguesa e o seu futuro é muito mais complexo.

Haveria ainda muito a dizer, nomeadamente sobre a baixa qualificação média dos patrões portugueses e das dificuldades de emprego de muitos dos nossos jovens licenciados, além da influência do vetor das migrações. Ficará para outra oportunidade!

Luis Barreira/MS

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