Aida Batista

Ser mãe é…

mother-going-to-the-airport-with-her-kids-2022-01-18-23-55-59-utc

 

Após duas maternidades, vividas ao ritmo da passagem de ausências por diversos mundos, é tempo de balanço, de me interrogar sobre a mãe que fui, sou e continuarei a ser até que a vida coloque o anunciado ponto inicial na orfandade que meus filhos irão sentir.

Como se adjetiva uma mãe? Como se define uma boa mãe? Se eu tivesse de escolher uma só palavra para me identificar como mãe, não sei qual escolheria. É-se mãe e chega, porque em cada mãe estão todas as mães do mundo: as que acertaram e as que muito erraram no seu papel de serem mães. Fui mãe muito cedo: uma filha aos 19 anos e um filho aos 20, num tempo em que, pese embora a muita bibliografia já existente, se funcionava mais por intuição, do que por conselhos ou manuais de puericultura.

Não se nasce mãe, mas aprende-se a ser mãe com a prática diária de muitas e surpreendentes aprendizagens.
Ter sido mãe muito jovem permitiu-me viver a maternidade sem angústias, numa irresponsabilidade saudável, como quem brinca com bonecas – de forma espontânea, sem medos, sabendo conciliar o despertar de um novo ser para a vida, com as cautelas que esse ato singular e iniciático exige de forma natural.

Ser mãe é sentir um ser crescer dentro de si, acariciando-o, desde o primeiro momento, através da pele que o envolve; ser mãe é dialogar com ele na comunhão dos silêncios que apenas os dois ouvem; ser mãe é sentir o movimento de um corpo que vive dentro de si a prazo; ser mãe é ver o seu corpo avolumar-se todos os dias sem nunca se queixar do desconforto; ser mãe é carregar as esperas da “hora pequena” sem saber quando esta chega; ser mãe é imaginar um rosto e sonhá-lo muito antes de o conhecer; ser mãe é o afago primeiro contra o peito da criança acabadinha de se soltar do aconchego do ninho uterino; ser mãe é ter ouvido de tísica, apurado para os sons que até então nunca a tinham feito despertar durante a noite; ser mãe é prescindir de si e estar sempre alerta, de atalaia na defesa das primeiras incursões adversas ao tesouro da sua vida; ser mãe é aprender a distinguir a dor, o sono, a fome, a fralda suja, a falta de uma voz ou de um abraço, nas diferentes tonalidades do choro; ser mãe é desfrutar, sem cansaço, o deslumbramento do olhar perante um ser que nasceu de nós; ser mãe é acompanhar a forma como ele se relaciona com o mundo, seguindo-lhe o olhar curioso; ser mãe é ouvir e registar os primeiros sons e vibrar de alegria quando ouvir o seu nome ser proferido pela primeira vez, conquistando um estatuto nunca antes nomeado; ser mãe é ouvi-lo ser repetido até à exaustão, assim que fazemos falta; ser mãe é sentir todas as dores dos filhos, oferecendo-se para uma troca impossível; ser mãe é dar aos filhos a liberdade de escolherem o rumo dos seus voos, mesmo quando estes se revelam pouco seguros; ser mãe é recebê-los de volta ao ninho, com os braços abertos em cada reencontro; ser mãe é ter sempre a porta aberta e a mesa posta de perdões, quando os regressos são de arrependimento; ser mãe é ter um sorriso estampado no rosto para esconder a dor que tantas vezes sente; ser mãe é caminhar lado a lado, e, à medida que o tempo passa, saber esbater a idade que nos aproxima; ser mãe é passar o testemunho da maratona da vida, sem a preocupação do lugar, mas de que a corrida chegue com sucesso ao fim; ser mãe é saber despedir-se na hora certa.

Silenciosamente ir-se apagando para viver na memória dos que deu ao mundo.

Aida Batista/MS

Redes Sociais - Comentários

Artigos relacionados

Não perca também
Close
Back to top button

 

O Facebook/Instagram bloqueou os orgão de comunicação social no Canadá.

Quer receber a edição semanal e as newsletters editoriais no seu e-mail?

 

Mais próximo. Mais dinâmico. Mais atual.
www.mileniostadium.com
O mesmo de sempre, mas melhor!

 

SUBSCREVER