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No topo da coragem

milenio stadium - ema dantas - everest

 

Longe de um cenário de igualdade de género, vivemos numa sociedade em constante evolução, mas que ainda surge envergonhada nessa questão tão crucial de se olhar para as mulheres da mesma forma que se olha para os homens.

Ema Dantas é uma das mulheres de garra, ambição e sucesso que hoje trazemos nesta edição dedicada ao empoderamento feminino. A escalar montanhas enquanto dá voz ao silêncio sério da saúde mental, Ema Dantas é, para além de tudo mais, uma mulher que serve e, com certeza, servirá muitas vezes de exemplo para tantas outras que, em algum momento da vida, vão duvidar das suas capacidades, sejam elas físicas, sejam elas mentais, pondo em causa o sucesso das suas metas – Ema Dantas será nesses momentos uma espécie de alarme que soará para lembrar que é sim possível e que, mesmo que nos olhem como se estivéssemos no andar de baixo, podemos até calçar um salto alto para que se lembrem que estamos ao mesmo nível.

milenio stadium - ema dantasMilénio Stadium: Chegar ao topo de uma carreira, tal como acredito que aconteça no escalar de uma montanha, não é um processo fácil, surgem obstáculos e exige preparação, dedicação, entrega. Enquanto mulher, sente que escalar a montanha da vida profissional foi mais complexo para si do que seria para um homem?
Ema Dantas: Sim. Tal como escalar montanhas, escalar a vida profissional foi e ainda é por vezes mais difícil para uma mulher do que para um homem. O ‘status quo’ na minha opinião continua e é como que se ao homem “pertencesse” esse lugar de estar a escalar uma montanha e “pertencesse” a posição de gerir uma empresa. A mulher pode gerir uma empresa, mas depois é vista como intimidadora, às vezes até por outras mulheres e também nas relações pessoais – especialmente se, por exemplo, o marido não tem a mesma vida profissional.

MS: Que referências femininas foram mais relevantes durante todo o seu percurso até aqui? Que mulher(es) mais admira e porquê?
ED: A minha mãe, a minha madrinha e a minha avó. A minha mãe nunca teve medo de trabalhar, mesmo sem falar inglês. Imigrante, trabalhou na limpeza, a apanhar minhocas durante a noite e trabalhou na apanha do tomate. Em fábricas, e a maior parte das vezes com dois empregos ao mesmo tempo. A ética do trabalho que tenho veio do que aprendi com ela, mas também aprendi que tinha que fazer tudo para não tolerar abuso doméstico, mesmo que isso me custasse viver sozinha. A minha madrinha Isabel ensinou-me amor próprio, mesmo quando é difícil de se encontrar e instilou em mim que eu podia fazer qualquer coisa, até subir montanhas. A minha avó paterna, ensinou-me que se pode criar os filhos, dar ‘conta da vida’ sem o homem estar em casa. Ela passou a maior parte da vida a criar os filhos sozinha, enquanto o meu avô estava no estrangeiro – França e Brasil.
Infelizmente nenhuma destas três mulheres estão vivas para verem aquilo que criaram em mim.

MS: Enquanto filha, mãe e avó, quais são os princípios que gostaria que ficassem vincados para as gerações que vão olhar para si como um exemplo?
ED: Não ter medo de trabalhar; de seguir os sonhos próprios, mesmo quando não são sonhos, mas sentem que aquilo que querem fazer vai ajudar alguém. De não ter medo de lutar por uma causa, mesmo que sejam criticados ou que seja algo difícil. Eu gostaria que as minhas filhas e a minha neta sentissem autoconfiança mesmo quando o coração parece estar a explodir fora do peito.

MS: A sororidade tem sido cada vez mais uma posição adotada pelas mulheres. Que importância tem essa união e aliança entre elas (nós)?
ED: Entre nós, quando conseguimos olhar umas para as outras com admiração, apoio e com respeito é ótimo. Eu profissionalmente tenho tido muita sorte em pertencer a várias associações profissionais femininas e acho o apoio mútuo importantíssimo. No alpinismo tenho tido o prazer de conhecer outras mulheres com a mesma motivação.

MS: Muitos homens (e também mulheres) não entendem/desconhecem o conceito de feminismo – acha que é por isso que não se dizem feministas ou porque, de facto, não acham que as mulheres devem reivindicar a igualdade política, jurídica e social?
ED: Eu acho que é a combinação de ambas as coisas. Primeiro não entendem o que é ser feminista na realidade, se calhar devido à forma como uma mulher feminista tem sido retratada e até, de uma certa forma, continua a ser. E assim acham que mulheres não se devem reivindicar a qualquer igualdade. Muitas vezes ouve-se a referência que as “feministas” querem ser homens ou mandar neles. Mas na realidade uma mulher feminista é só uma mulher com muita autoconfiança, consciente das ideias dela e como pode usar isso para contribuir de forma igual para a sociedade. E consegue fazê-lo com sapato de tacão alto se for necessário.

MS: Vivemos ainda numa sociedade com ainda óbvias desigualdades de género. No entanto, sente que agora, em pleno 2022, estamos já a caminho do equilíbrio necessário entre homem e mulher?
ED: Não. Ainda há muito para fazer a esse respeito.

MS: A Ema Dantas está à frente de um projeto muito especial – Peaks For Change. Este ano, vai tentar novamente subir o Everest, depois de já ter chegado ao topo das maiores montanhas do mundo. Podemos dizer que a sua perseverança e a sua vontade de atingir todos os objetivos a que se propõe, são impulsionados (até certo ponto) pelo facto de uma mulher ter ainda que demonstrar que é, também ela, capaz de o fazer?
ED: De uma certa maneira sim. Mas para mim é muito mais. Eu vejo esta desigualdade entre mulheres e homens, de uma certa forma, do mesmo jeito que vejo a falta de compreensão entre a saúde física e saúde mental.

Catarina Balça/MS

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