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Fotógrafo luso-canadiano de Toronto homenageia romeiros de São Miguel

joseph amaral - heres the thing-  - milenio stadium - 2022-04-29

 

Numa entrevista conduzida por Vince Nigro para o programa “War Zone” da Camões TV, Joseph Amaral, fotógrafo comercial que descobriu a paixão pela arte aos 17 anos, explicou-nos que durante três anos fotografou romeiros em São Miguel para tentar captar a sua energia e poder mostrá-la ao público. O resultado vai estar em exibição na Peach Gallery em Toronto durante o mês de maio para celebrar os 500 anos dos romeiros. A mostra insere-se nas comemorações oficiais da Portugal Week 2022 em Toronto.

Apesar de ter nascido naquela ilha de onde saiu apenas com seis anos, em Toronto Joseph Amaral cresceu pouco ligado à comunidade portuguesa. Nos últimos anos, numa viagem à sua ilha, descobriu os romeiros e acabou por se tornar numa espécie de irmão para estes homens que percorrem as ruas da ilha uma vez por ano na altura da Quaresma.

Vince Nigro: Fale-nos um pouco sobre si. Onde é que cresceu?
Joseph Amaral: Sou de S. Miguel, nasci em Povoação e quando tinha seis anos, em 1963, os meus pais vieram para o Canadá. Cresci num bairro muito polaco/irlandês, nunca nos envolvemos muito na comunidade portuguesa. Os meus pais afastavam-se e eu sempre me perguntei porquê. Mais tarde na vida, quando a minha mãe faleceu, descobri a resposta a essa pergunta.

VN: E porquê esse afastamento?
JA: É complicado, mas vou tentar simplificar. Basicamente, eu tenho dois pais e duas mães, os biológicos e os adotivos. Os meus pais biológicos tiveram 11 filhos e eu era o número oito. Os meus pais biológicos e os meus pais adotivos eram muito amigos e combinaram que se a minha mãe desse à luz um rapaz iam entregá-lo porque não tinham condições financeiras para ter mais filhos. Os meus pais adotivos não queriam que eu descobrisse que era adotado e por isso afastaram-se da comunidade portuguesa. Por isso não cresci muito exposto à cultura portuguesa. Falávamos português em casa, mas não interagíamos com a comunidade local.

VN: Quantos anos tinha quando soube que era adotado?
JA: Tinha 36 anos e descobri no dia do funeral da minha mãe. O meu pai pediu-me para levar uma amiga a casa e antes de ela sair do carro ela virou-se para mim e basicamente disse que o meu pai me amava como um verdadeiro pai. Depois ela foi embora e eu fiquei a pensar nisto durante dias. A minha mãe tinha acabado de falecer e eu estava devastado, ouvir aquilo naquele dia foi duro. Um mês depois, comecei a ligar a alguns familiares e eles disseram que o desejo da minha mãe adotiva era não me contar. Para mim ela é a minha mãe verdadeira. Entretanto descobri que todos os meus irmãos tinham emigrado para os EUA em 1969.

VN: Crescendo na comunidade polaca/irlandesa, sabia que era português?
JA: Sim, os meus pais eram muito portugueses. Quando viemos para cá, eles não falavam inglês e eu fazia de tradutor. Falávamos muito inglês em casa porque os meus pais queriam aprender inglês e a cultura canadiana.

VN: Quando é que decidiu que queria tentar ser fotógrafo?
JA: Tive a minha primeira máquina fotográfica aos 17 anos. Um dia fui almoçar com um amigo que estava acompanhado por um fotógrafo que ia fazer um desfile de moda no dia seguinte. O fotógrafo perguntou-me se queria ganhar $50 para segurar a sua máquina fotográfica. Eu apareci, fiz o que ele me pediu e no final do trabalho ele deu-me uma máquina fotográfica e disse para ir em frente e fazer as minhas próprias fotos. No dia seguinte, comecei a procurar formação em fotografia e nunca mais parei.

VN: Quando pegou naquela máquina fotográfica pela primeira vez era completamente autodidata?
JA: Sim, só mais tarde é que fui para a escola aprender fotografia. No início ia para a biblioteca pública e trazia o máximo de livros que conseguia. Comecei a fotografar com amigos durante um ano, durante o dia tinha um trabalho a tempo inteiro e à noite ia para o meu estúdio. Entretanto encontrei outros dois fotógrafos pelo caminho e comecei a associar-me a eles. Aprendi como funcionava o negócio da moda, como conseguir modelos… Fui estudar para a Ryerson University [agora Toronto Metropolitan University] e percebi que tinha muito que aprender. Grande parte da minha carreira foi feita em Toronto, mas passei um ano a fotografar em Los Angeles e seis meses em Nova Iorque, nos EUA.

VN: Sempre se interessou pelo mesmo estilo de fotografia ou foi mudando ao longo dos anos?
JA: Trabalhei na área da moda durante cerca de 10 anos e depois comecei a pensar que devia existir mais para além daquele mundo. Tive alguns projetos editoriais e percebi que era aí que pertencia porque gosto de criar histórias. Comecei a trabalhar em pequenos projetos e as reações foram muito boas. Não me identifico como artista, sou um fotógrafo a tentar contar uma história.
Aprendi a ser tecnicamente eficiente no mundo comercial. Quando comecei a fotografar editorial, comecei a olhar para a emoção e queria captar isso. Agora tenho 65 anos e entrei no mundo da arte há cinco anos. Espero que à medida que faça mais trabalhos melhore e a minha fotografia evolua.

VN: Muitos artistas criam a sua própria marca ou estilo. Qual é o seu?
JA: É definitivamente uma técnica em evolução. Olho em volta para o meu trabalho e ao olhar do público pode parecer acabado, mas quando olho para as minhas fotografias, sinto que poderia ter feito mais. Por isso, da próxima vez, vou tentar ir mais fundo.

VN: Porque é que decidiu fotografar os romeiros de São Miguel?
JA: A minha mulher e eu decidimos ir a São Miguel durante um ano. Ela estava a trabalhar num livro, e eu não tinha projetos na altura. Acho que foi algures em fevereiro, estávamos a ouvir uma música em casa e eu ouvi este barulho na rua. Perguntei ao meu primo que tinha uma casa ao lado da nossa quem eram aqueles homens e ele disse-me que eram romeiros que percorriam as ruas da ilha. Entrei no carro e comecei a fotografá-los. Passei um dia inteiro a fotografar um rancho e só parei quando eles foram descansar. Nas sete semanas seguintes continuei a fotografá-los. Esta peregrinação atrai pessoas de todo o mundo à ilha durante a Quaresma e este ano assinala 500 anos de existência. Estou habituado a olhar para estas fotos no monitor e não em grandes dimensões como aqui nas paredes da Peach Gallery, mas acho que têm outro impacto…

VN: Esta mostra reúne fotografias de vários anos?
JA: Estive a fotografar os romeiros durante sete semanas, misturei-me com eles e tornei-me num irmão, tal como eles me chamavam. Senti uma energia poderosa que estava a tentar captar nas fotografias. Três anos depois voltámos a São Miguel e passei mais sete semanas a fotografar romeiros. Queria ter ido uma terceira vez, mas, entretanto, surgiu a pandemia de COVID-19 e tive de cancelar os planos. Mas apesar de tudo consegui criar uma exposição que homenageia os romeiros na celebração dos seus 500 anos de existência.

Joana Leal/MS

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